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Direcção do Instituto de Menores acusada de pressionar docentes a despedirem-se

 

Dizem-se alvo de chantagens, para que se demitam das funções ou dêem pretextos para o seu despedimento. Em causa, um pedido já de longos anos para melhoria das condições de trabalho

As condições de trabalho há muito que são “exploratórias”, pelo que um grupo de professores do Instituto de Menores (IM) luta desde o início da carreira por um regime de trabalho semelhante aos restantes trabalhadores da função pública, em vez do seu actual “contrato de tarefa” que não lhes admite as mesmas regalias.

A Direcção dos Serviços dos Assuntos de Justiça (DSAJ), que tutela o IM, prometeu regularizar a situação mas ao cabo de oito anos nada mudou. Os nove professores decidiram recorrer ao presidente da Associação de Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), José Pereira Coutinho, que interpelou o Chefe do Executivo em Setembro, segundo revelaram ao Hoje Macau numa reunião ontem, pelas 18h30, na sede da ATFPM. À hora de saída do encontro, o Hoje Macau já não teve possibilidade de realizar contacto com a direcção do IM.

Desde a interpelação, referem os docentes, a situação tornou-se insustentável no estabelecimento onde dão aulas, já que “mais do que nunca” são “alvo de pressões por parte da direcção” para forçá-los “a demitirem-se”.

“O superior hierárquico directo está a actuar com mais maldade do que antes e os seus actos têm conduzido à redução do moral dos referidos trabalhadores”, disse o também deputado mais tarde em interpelação escrita ao Governo a 21 de Fevereiro deste ano. “Ameaçou o referido grupo de docentes ao afirmar que o contrato que iam assinar era o último e dizia-lhes que seria melhor prepararem-se o mais cedo possível para procurar trabalho.”

Os professores, actualmente na casa dos 30 anos, iniciaram a sua carreira de ensino no IM. Desde então que procuram melhores condições, tais como regime de providência, subsídio de residência, acesso aos cuidados de saúde e outras regalias, além de mais férias – apenas gozam de 11 dias remunerados de descanso e muitas vezes, nesse período, regressam ao estabelecimento para dar lições. Ou seja, pedem as condições que os restantes trabalhadores da função pública com contrato de trabalho individual beneficiam. Por essa razão, deixaram de confiar no director da DSAJ, André Cheong, que dizia, desde o início das suas carreiras, procurar encontrar-lhes novos termos de trabalho.

Na última reunião com o responsável, a 21 de Março, alegam que foi por essa perda de confiança que não falaram das “torturas psicológicas”. “Não tivemos coragem de dizer as ilegalidades cometidas e de que somos objecto de pressão constante”, conta um dos porta-vozes do grupo de docentes. “Algo que tem vindo a piorar depois de termos decidido apelar a outros organismos.”

Recentemente, a 28 de Maio, uma das professoras apresentou queixa ao Comissariado Contra a Corrupção (CCAC). Responderam-lhe que teria resposta em 30 dias, depois de averiguado todo o processo. Desde então, garante, tem-se visto a braços com novos actos discriminatórios. “Um dia a directora do IM tirou-me a hora de almoço para tratar de coisas do serviço, sendo que depois tinha aulas. Obrigou-me a dizer para um gravador que pedia dispensa para não ir à aula. Senti-me mal e pedi que me deixasse sair pois já estava a ficar indisposta. Sem sucesso. Passado uma hora comecei a ficar muito nervosa e indisposta e foi então que me libertou porque ficou com medo.”

Quanto à denúncia feita junto do CCAC, o grupo espera agora que faça a recomendação ao patronato e ao Governo de regalias idênticas aos de outros trabalhadores de função pública e que estes abusos deixem de existir.

 

Governo não dá esperança

Pereira Coutinho recebeu uma resposta do Chefe do Executivo, que se disse “atento à manutenção da estabilidade da equipa de funcionários” e apologista da necessidade de “estabelecer mecanismos justos”. Mas não houve mudanças concretas.

Na interpelação que fez ao Governo, Pereira Coutinho falava na urgência de “substituir o mais rápido possível o contrato de tarefa por um de trabalho individual” e de o Governo “apurar a responsabilidade dos infractores”, tendo pedido garantias e prazos para tal. A resposta veio então do director dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP), José Chu. Afirmou não existir possibilidade de contrato individual, embora os docentes licenciados – que satisfazem os requisitos definidos pela Direcção dos Serviços de Educação e Juventude (DSEJ) – preencham os requisitos para o exercício de funções. A DSEJ nomeia-os para o IM mas é à DSAJ que compete o seu recrutamento. “Dado que no quadro pessoal da DSAJ não existe a carreira de docente, não é possível recrutar docentes mediante a forma geral de recrutamento para os trabalhadores da função pública.”

Por outro lado, avançou que “estes docentes de aconselhamento gozam de 22 dias úteis de férias anuais mas estão condicionados devido à natureza do contrato”, não podendo ter direito às regalias pedidas.

Depois da SAFP ter entrado em contacto com os dirigentes da DSAJ – que assumem ter-se reunido com o grupo de professores – disse que, tanto quanto sabem, a directora do IM, Wu Kit Yu, não ameaçou o referido grupo sobre não renovar contrato em Janeiro, nem os forçou, mediante formas inadequadas, a “deixar de exercer as funções por iniciativa própria”, lê-se no comunicado. No entanto, a DSAJ falou da pressão que dizem sentir – relativa ao número de aulas, férias, local de trabalho – e que espera melhoramentos na actual forma de recrutamento e nos benefícios. A DSAJ comunicou também a vontade de acompanhar a situação dos docentes.

Por sua vez, a SAFP volta a frisar que, segundo o actual Regime das Carreira dos Trabalhadores dos Serviços Públicos, o contrato de tarefa “não constitui qualquer vínculo funcional com a Administração Pública, e não existe qualquer fundamento legal para que o contrato de tarefa possa ser substituído por outros tipos de contratos ou carreiras”. Ainda assim, “o Governo da RAEM está a proceder aos trabalhos de revisão do regime de contratos, que será objecto de uma consulta pública”.

 

Ameaças constantes

Em reunião com os trabalhadores do IM, ontem à tarde na ATFPM, foram descritas ao Hoje Macau algumas situações que tendem a criar-lhes um ambiente instável, sem garantias e sem protecção, onde constantemente são postos à prova. “Amanhã vamos ser transferidos do local de trabalho, vão-nos mudar aos nove para um gabinete onde caberia apenas um docente”, relata um dos porta-vozes. A circunstância não será nova, dado que, contam, várias vezes lhes mudam as salas, o que inevitavelmente afecta o ensino já que não têm condições estáveis para dar aulas. “Cada vez que vem o delegado do Ministério Público, a direcção dá-lhe a sala por um dia. Voltam a transferir-nos a nós e aos materiais – computadores e outros utensílios. Como é que é possível que não nos arranjem um sítio permanente?” Outra professora diz-se alvo de “bocas” por parte da directora do Instituto – diz-lhes que “estão a mais na instituição”. Duas professoras também se vêem obrigadas a ficar muitas vezes depois do expediente para longas reuniões, onde têm de reportar as aulas e o comportamento dos alunos em tempo muito mais longo do que seria de esperar. “Prendem-nos com assuntos menores.” A situação mais flagrante decorreu recentemente. Aquela que seria a habitual despedida do ano lectivo, onde participam professores, pais e alunos, transformou-se num “Encontro de Almoço entre Amigos”, ao qual os docentes não foram convocados. A 22 de Junho, apenas estiveram no evento a direcção, administrativos e assistentes sociais, além dos pais e alunos. A justificação não convenceu. “Foi-nos dito que iria decorrer fora da hora de expediente e que, por isso, iria prejudicar o descanso dos professores.”

 

hoje macau   27 Jun 2012

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