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hoje macau  11 Nov 2011

 

Saúde pública: um doente terminal

 

 

Carlos Morais José

 

O que não se compreende é a inacção, o crescimento descontrolado das filas de espera nas consultas, a prestação cada vez pior de serviços médicos ao povo. Para quem governa o governo? Não será para o povo? Então que altos interesses populares estão aqui a ser defendidos?

A IMENSIDÃO temporal que os doentes têm de atravessar para conseguirem uma consulta nos Serviços de Saúde da RAEM assemelha-se a uma verdadeira odisseia. E, para o governo de Chui Sai On isto deveria ser uma vergonha porque, na verdade, trata-se de uma prova da incompetência do actual Chefe do Executivo que foi durante dez anos o responsável directo por esta área.

Mas, pelos vistos, não é. Quando o nosso Ulisses chega finalmente à consulta do hospital público é para verificar que a sua Penélope já o traiu com um dos pretendentes, de seu nome Kiang Wu. A política de esvaziamento das capacidades de atendimento do hospital público acabou, finalmente, por ter as suas consequências. Elas aí estão: segunda uma reportagem ontem publicada neste jornal, mesmo pessoas com problemas cardíacos vêem-se sujeitas a mais de meio ano de espera, algo que o coração poderá facilmente não aguentar. Nestes casos, quem espera, não desespera: morre, pura e simplesmente.

Já o governo parece aguentar facilmente esta situação tão esquisita. E esquisita porque estes governantes dão a entender que não sabem como gerir a saúde pública, o que é ainda mais estranho quando verificamos que Chui Sai On até tem nesta área uma licenciatura, um mestrado e um doutoramento. Estes graus académicos, aparentemente, não servem para nada: a sua gestão enquanto Secretário responsável pela área caracterizou-se por uma depreciação constante e concertada do hospital público, levando paulatinamente à actual situação. Ao que me dizem, não está ainda pior devido ao profissionalismo de médicos e enfermeiras que corajosamente não abdicam do seu espírito de missão.

A que conclusões poderemos chegar? Vejamos as premissas:

1. Temos um Chefe do Executivo formado em Gestão de Saúde Pública.

2. Vivemos numa região riquíssima, com um dos mais elevados PIB per capita do mundo.
Perante estes dois factos, o que nos dita a lógica? Que o governo não está interessado na Saúde Pública; pelo contrário, tudo faz para a destruir, no sentido de favorecer o florescimento da medicina privada, nomeadamente do Hopsital Kiang Wu. Por quê?, pergunta o cidadão acabrunhado e triste por este desinteresse governativo. Pois não sabemos, mas seria interessante perguntar ao governo, na expectativa de obter uma daquelas respostas enigmático-positivas e talvez de ver aumentar o valor expresso nos cheques da comparticipação financeira.

Quanto a mim, o que acho mais estranho no meio disto tudo é o facto de Chui Sai On ter feito um mestrado e um doutoramento em “Public Health”, na Universidade de Oklahoma, ou seja, num país conhecido por ter uma das piores saúdes públicas no mundo civilizado. Certamente que o nosso Chefe do Executivo não gosta dos documentários de Michael Moore, nomeadamente do famoso “Sicko”, no qual são descascados os malefícios dos sistema de saúde norte-americano. Ora como é que ele vai escolher justamente os Estados Unidos para fazer um curso destes? É como estudar fissão nuclear no Togo ou nos Camarões.

O que também se torna relativamente desesperante por aqui é que não existe uma indicação clara de qual é realmente a política do governo para a Saúde. Não é elucidada uma ideia, uma perspectiva, uma estratégia. Quem o confessa é o próprio director dos Serviços de Saúde que, com uma ingenuidade lamentável, vem afirmar que não estava previsto o crescimento de Macau depois da liberalização do jogo. São desculpas esfarrapadas atrás de desculpas desenvergonhadas. E outras se seguirão, de maior ou menor calibre.

O que não se compreende é a inacção, o crescimento descontrolado das filas de espera nas consultas, a prestação cada vez pior de serviços médicos ao povo. Para quem governa o governo? Não será para o povo? Então que altos interesses populares estão aqui a ser defendidos? Admito, na minha aldeã ignorância, que estejam mas eu não consigo vislumbrá-los. Já outros…

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