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INTERPELAÇÃO ESCRITA

 

O meu Gabinete de Atendimento aos Cidadãos registou nos últimos três meses, um aumento substancial de queixas dos cidadãos de Macau contra a anarquia do tráfego rodoviário derivado na maior parte dos casos devido ao aumento brutal dos “shuttle bus” e dos automóveis ligeiros registados para turismo. Enquanto a maioria dos cidadãos que trabalham e pagam impostos são obrigados a pagar uma multa por terem esquecido de introduzir uma “moedinha” no parquímetro, os “shuttle bus” e os automóveis ligeiros registados para turismo, têm o privilégio de circular, estacionar e parquear com a maior das impunidades.

 

Os queixosos alegam ser cada vez muito difícil encontrar um local nos silos públicos (devido aos parques permanentes reservados por alguns serviços públicos e concessionárias) bem como nas ruas para parquear uma motocicleta ou automóvel particular, enquanto as empresas de construção civil e as do turismo podem parquear com quase total impunidade por quase toda a cidade, sendo o caso mais flagrante e paradigmático o estacionamento de camiões para transporte de contentores de vinte e os de quarenta metros de cumprimento mesmo em frente da rua defronte da porta principal da Assembleia Legislativa não obstante toda ela estar marcada com linha amarela contínua. Porém, e muito estranho, acontece que, uma vez por ano, na altura em que o Chefe do Executivo vem apresentar as Linhas de Acção de Governativas (LAG) na Assembleia Legislativa, estes camiões deixam de estacionar em frente da Assembleia Legislativa, reaparecendo logo após o fim das LAG.

 

Dados oficiais da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), relativos a 2010, dão conta de um aumento significativo do parque motorizado em Macau, atingindo-se números incríveis como 83879 automóveis ligeiros, 6335 automóveis pesados e 106420 motociclos e ciclomotores (estes num total de 43869 unidades). O agravamento dos congestionamentos que ocorrem no trânsito citadino, está relacionado com o aumento brutal dos “shuttle bus” e os automóveis ligeiros registados para turismo, a considerar 719 automóveis ligeiros e 1451 automóveis pesados de turismo conforme quadro abaixo referido.

 

Turismo

automóveis ligeiros

variação 

automóveis pesados

variação

2001

142

---

527

---

2002

159

+ 17

561

+ 34

2003

178

+ 19

599

+ 38

2004

225

+ 47

707

+ 108

2005

307

+ 82

944

+ 137

2006

411

+ 104

1049

+ 105

2007

599

+ 188

1247

+ 198

2008

613

+ 14

1345

+ 98

2009

688

+ 75

1396

+ 51

2010

719

+ 31

1451

+ 55

 

Com o beneplácito do Governo, o número de automóveis ligeiros registados para turismo cresceu de uma forma assustadora para cerca de 500% e o número de automóveis pesados de turismo cresceu cerca de 275%. Para além do seu número exagerado, o Governo tem desleixado na fiscalização aos autocarros turísticos, vulgo “shuttle-bus”.

 

E este excesso tem contribuído para o congestionamento do tráfico rodoviário e deterioração do meio ambiente, isso porque no início dos novos empreendimentos ligados ao sector do jogo e do turismo, os automóveis pesados de passageiros que se encontravam a circular em Macau mudaram de proprietário e de empresa, operação efectuada mediante uma mera formalidade administrativa na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis.

 

Numa segunda fase, as novas empresas, como a Sands, a Venetian, a MGM, a COD decidiram importar os seus veículos novos, criando novas frotas e oferecendo transporte gratuito desde os locais de entradas de visitantes aos grandes empreendimentos hoteleiros e, mais tarde, entrando directamente do interior do continente. Tudo isto feito legalmente, tendo por base uma disposição legal datada de 1998, a Portaria nº. 219/98/M, de 19 de Outubro.

 

A Portaria, que proíbe a importação e matrícula de veículos motorizados usados, bem como de motores e quadros usados, e também proíbe a importação de veículos pesados de passageiros, permite algumas exclusões, designadamente no que toca a veículos pesados de passageiros.

 

Os veículos a importar nos termos das alíneas b) a f) do número anterior têm de dispor de local próprio para recolha, podendo a Direcção dos Serviços de Economia, com parecer do Leal Senado de Macau e, eventualmente, de outras entidades, recusar a sua importação quando se entenda que o número de veículos já matriculados em nome da entidade requerente é suficiente para a satisfação das suas necessidades.”

 

Os veículos importados nos termos do presente artigo podem ter utilização diferente do transporte de passageiros desde que a sua transformação, quer pelos seus fins, quer pelas suas características técnicas, seja justificável e aprovada pelo Leal Senado de Macau.”

 

A actividade de interesse para o Território a que se refere a alínea e) do n.º 2 e as condições do serviço a prestar são reconhecidas por despacho do Governador.”

 

E é aqui que a questão se coloca, com particular incidência nos últimos anos, com a Direcção dos Serviços de Turismo (DST) a emitir pareceres sobre a importação deste tipo de veículos para o sector do turismo do que resultou o crescimento que as estatísticas oficiais mostram.

 

Mas o apoio indiscriminado às referidas empresas não deve constituir um desrespeito às normas legais, por exemplo, quanto ao local próprio de recolha e estacionamento para cada um desses veículos, evitando a saturação do parqueamento nas vias públicas. Se os interessados declaram que possuem esse espaço, é suposto, fazerem tal, porque razão o Governo tem de “inventar” espaços especiais na via pública para o seu estacionamento?

 

E aquelas entidades que se intitulam promotoras de jogo (transporte VIP dos jogadores), porque é que ocupam também esse precioso espaço público, estacionam em qualquer lado, por exemplo de forma abusiva no Terminal Marítimo de Macau, beneficiando pela sua actividade, “de privilégio rodoviário”?

 

Numa altura tão importante como foi a recente celebração do Ano Novo Chinês, foi triste verificar que, se calhar, a necessidade de tanto transporte para turistas é desnecessária tantos eram os veículos imobilizados em época alta de turismo.

 

A propósito qual a entidade que faz a análise desse parque específico tendo em conta a necessidade real – a DSE autoriza as importações, a DST não estipula quotas, a DSAT inspeciona os novos veículos e emite os documentos de identificação e a CRCBM regista a propriedade. Mas no final os cidadãos e os turistas que nos visitam tem de sofrer com o congestionamento e falta de cumprimento de regras básicas da Lei do Trânsito Rodoviário. Desde o estabelecimento da RAEM que o Governo tem desleixado na fiscalização aos autocarros turísticos, vulgo “shuttle-bus”. Sabendo-se que em breve vai arrancar mais um grande empreendimento do sector do jogo e do turismo, e há projectos para mais, e que também eles vão querer viaturas, ligeiras, pesadas, para lá levar os visitantes, e que vai existir uma nova operadora de transportes públicos, esta questão é algo crítica e algo terá de ser bem equacionado.

 

Sem esquecer os locais “inventados” na via pública para acomodar o estacionamento dos ligeiros e pesados de passageiros e carga da Administração Pública, serão necessários tantos automóveis pesados de passageiros?

 

Embora a Portaria refira que os veículos a importar devam dispor de local próprio para recolha, basta andar por aí para ver que as entidades que que os importam não dispõem desses locais e as entidades responsáveis não fiscalizam.

 

Os parques destinados a autocarros de turismo no terminal marítimo do Porto Exterior e na Praceta do Museu de Macau servem sobretudo os ligeiros de turismo levando muitos dos pesados a estacionar em vias adjacentes (o “pit-lane” do Grande Prémio e a Rua de D. Belchior Carneiro).

 

Noutros locais, o cenário é eloquente com inúmeros veículos estacionados em locais arranjados pela administração, vejam-se os casos do parque defronte do Macau Jockey Club na Taipa, basta passar por lá a qualquer hora do dia e da noite e ver veículos das diversas operadoras do jogo. (Onde funcionou o centro de exames de condução), no silo sob o Tap Seac, em terrenos no NAPE junto à Torre de Macau (o próprio espaço reservado para a queima de panchões no Ano Novo Lunar) e vejam-se os pesados de passageiros e também ligeiros de agências de turismo ali parados, estacionados.

 

Parece ser altura de dizer basta a esta situação e trabalhar-se de forma unida, deixando de lado o conceito de “quinta departamental”, fazendo um levantamento exaustivo deste tipo de veículos, estudem-se mudanças da legislação, exerça-se uma fiscalização efectiva, haja sentido de responsabilidade para encarar os factos e saber o que fazer.

 

O Director da DSAT que refere que os dados de que dispõe apontam para 2100 veículos de passageiros, um Subdiretor da DST que refere outros números (150 agências de viagens das quais 30 gozam da isenção do imposto) e há que pensar com factos concretos:

 

Afinal o que é está em causa em toda esta anarquia do tráfego rodoviário? Será a questão de receita fiscal? Será a questão do desenvolvimento do sector do turismo? Ou não será a satisfação de interesses particulares de um determinado sector de detrimento da maioria da população que se vê sacrificada e prejudicada na sua qualidade de vida?

 

Quando vai ser efectuado um levantamento exaustivo deste tipo de viaturas? No total quantas são? A quem pertencem? Onde estacionam? Que fiscalidade (isentos e não isentos)? E já agora quantas viaturas desse género pertencem ao Governo, onde estacionam e qual o grau de utilização?

 

Quantos são os automóveis ligeiros de luxo ao serviço dos promotores de jogo? Porque podem utilizar os parques destinados a autocarros de turismo? Quantas são destinadas a finalidades essencialmente pessoais e fora do contexto turístico?

 

Porque permite os abusos na utilização deste tipo de serviços, em que muitos desses autocarros ou “shuttle-bus” operam numa total impunidade no centro da cidade? Por exemplo, em frente ao Hotel Sintra, fazendo concorrência desleal às duas companhias de transportes público e aos táxis?

 

Por exemplo, no Terminal Marítimo de Macau e Museu de Macau (casos muito significativo), porque razão espaços públicos definidos para estacionamento de autocarros de turismo, devidamente assinalados por sinalização vertical, é maioritariamente utilizado por outro tipo de veículos? As autoridades (DT/CPSP e a DST) não vêem?

 

A DSAT, em vez de se preocupar com questões relativas, deveria estudar a médio/longo prazo: o que fazer a estes autocarros todos quando o metro ligeiro começar a funcionar e este serviço começar a ser um extra? Vão ser transferidos para a posse de que agências de viagens? Vão reverter para a Administração? Vão ser vendidos e exportados?

 

Outra questão é ausência de quase total fiscalização nos operadores das grandes unidades de hotelaria e jogo para poderem usufruir deste tipo de serviço, eventualmente permitido para o transporte de hóspedes para e do respectivo hotel. Mas existirá controlo para confirmar se os utilizadores desses autocarros são mesmo hóspedes?

 

Portanto o Governo deve impor uma limitação ao número de viaturas utilizadas nesse serviço, deve ser imposta, ponderando-se vários factores o mais importante a existência de locais de estacionamento (a legislação obriga a tal, a DST analisa o pedido, quem verifica essa existência? Sendo declarado a existência desse parque, pode esse mesmo parque pode ser utilizado para dez, vinte, trinta ou mais veículos?

 

Os dados estão lançados, o Director da DSAT assumiu e vai ter de fazer algo, o Subdirector da DST, mais inteligente, “recebeu a bola e passou-a” e a DST mantém a sua imagem limpa (mas é um grande responsável pela anarquia que existe), os grandes interesses na área do turismo vão continuar a fazer o que bem lhes interessa com o conluio da Administração.

 

Assim sendo, interpelo o Governo, solicitando que me sejam dadas respostas, de uma forma CLARA, PRECISA, COERENTE, COMPLETA e em tempo útil sobre o seguinte:

 

1. Quando vai o Governo regulamentar, regular e fiscalizar de uma forma lógica e sistemática os “shuttle bus” e os automóveis ligeiros registados para turismo que operam com quase total impunidade, como por exemplo, o quiosque de uma concessionária em frente ao Hotel Sintra, fazendo concorrência desleal às duas companhias de transportes público e aos táxis? Quando vai o Governo começar a exercer a fiscalização nos operadores das grandes unidades de hotelaria e jogo para poderem usufruir deste tipo de serviço permitido somente o transporte de hóspedes para e do respectivo hotel? Existe neste momento algum controlo para confirmar se os utilizadores desses autocarros são mesmo hóspedes?

 

2. Quando vai a DSAT começar por planear a médio e longo prazo quanto ao destino dos “shuttle bus” principalmente quando o metro ligeiro começar a funcionar e este serviço começar a ser um serviço extra e excedentário? Vão ser transferidos para a posse de que agências de viagens? Vão reverter para a Administração? Vão ser vendidos e exportados?

 

3. Quando vai ser efectuado um levantamento exaustivo dos “shuttle bus” e os automóveis ligeiros registados para turismo? No total quantos são? A quem pertencem? Como são estacionados durante o serviço e onde ficam estacionados no final do dia de trabalho? Que fiscalidade (isentos e não isentos)? Quantas viaturas desse género pertencem ao Governo, onde estacionam e qual o grau de utilização?

 

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 07 de Abril de 2011.

 

José Pereira Coutinho

 

 

 

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