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INTERVENÇÃO ANTES DA ORDEM DO DIA

 

Desde a criação da RAEM que a preocupação do Executivo com a reforma e produção legislativas de Macau tem sido notória. Para ajudar a este delicado e fundamental processo, foram já muitas as intenções proclamadas e ainda mais os recursos utilizados. A título de exemplo, posso citar as LAG para 2003, em que o anterior Chefe do Executivo (CE) afirmou que havia sido definido “Plano de Produção/Revisão Legislativa a Curto e Médio Prazo da RAEM, com vista a permitir que o desenvolvimento do ordenamento jurídico da Região e as reformas jurídicas possam ser realizadas de acordo com o planeado. O grupo interdepartamental criado para esse efeito desempenhou positivamente as suas funções no âmbito de coordenação geral e concretização dos trabalhos ou as LAG para 2007 onde se afirmou que a intenção era acelerar e aprofundar “a reforma do Sistema Jurídico em todas as vertentes. O Governo irá recorrer aos serviços de uma equipa de peritos com elevado sentido de responsabilidade e competência profissional para se dedicar exclusivamente aos trabalhos de redacção legislativa, com vista a produzir, quer em termos quantitativos, quer em termos qualitativos e com eficiência, os melhores resultados possíveis.”

 

Com vista a conseguir dar cumprimento a estes objectivos, a Secretária para Administração e Justiça (SAJ) teve ao seu dispor nos últimos anos avultados recursos, tendo-lhe sido permitido criar inclusive um gabinete centralizador e coordenador da produção legislativa, que é o Gabinete da Reforma Jurídica (GRJ).

 

Sucede porém que nenhuma destas medidas funcionou em pleno, e nenhuma destas promessas foram cumpridas. Sob o comando e coordenação geral da SAJ, a produção legislativa continuou lenta, desadequada, desajeitada muitas vezes coxa, e a coordenação entre Direcção dos Serviços dos Assuntos de Justiça (DSAJ), GRJ e Gabinete para os Assuntos do Direito Internacional (GADI) e o Governo continua praticamente inexistente.

 

Como que reconhecendo o seu fracasso nas medidas da sua autoria, a SAJ pretende agora fundir o GADI e o GRJ numa única estrutura, uma nova Direcção de Serviços vocacionada para a coordenação e planificação dos trabalhos de reforma jurídica. Ou seja, desperdiçou-se tempo e dinheiro a criar um organismo centralizador e coordenador da produção legislativa, apenas para agora se concluir que ele não está a cumprir a sua função e simplesmente fundi-lo a um outro, com funções e propósitos diferentes.

 

A este respeito, é importante salientar que nunca se ouviu da SAJ qualquer crítica ao GRJ ou ao GADI, fazendo presumir que estes têm funcionado e cumprido com rigor e qualidade as suas atribuições.

 

Ora, quem não tem cumprido adequadamente com as suas tarefas é a SAJ, que tem, em última análise, a responsabilidade por assegurar que os vários organismos sob a sua alçada são convenientemente coordenados. A verdade é que tem sido a SAJ quem tem falhado – desde há vários anos – no seu papel de mediadora e coordenadora principal das fontes de produção legislativa. E as críticas provenientes de quase todos os quadrantes sociais, não têm parado de aumentar ano após ano, contribuindo para acentuar a imagem negativa do Governo desde o estabelecimento da RAEM, não só a nível local como regional e internacional.

 

No entanto, a SAJ tenta agora a solução mais fácil para mascarar a sua falta de capacidade de coordenação e de liderança: fazer uma operação cosmética na justiça e fundir dois organismos independentes, com tarefas e atribuições diferentes, num só, que vai ter competências que deviam caber, em primeira análise, à DSAJ!

 

Ou seja: como não consegue cumprir as suas tarefas e obter a necessária coordenação, a SAJ coloca todos os organismos no mesmo sítio, na esperança que eles se coordenem como que por magia. Coordenar é por definição ligar coisas e objectivos distintos, não pode ser colocar tudo no mesmo saco e empurrar responsabilidades para outros. A solução da SAJ, aplicada à RAEM toda, parece sugerir que se fundam todas as Secretarias, Direcções de Serviços, Gabinetes, Comissões e Comités num só, para melhorar a coordenação!

 

Como é evidente, esta infeliz medida vai sem dúvida criar sobreposições de procedimentos e de estruturas internas dos dois organismos que vão demorar tempo e exigir capacidade para resolver, ou seja, a produção legislativa necessária para a evolução e melhoramento da RAEM vai ser ainda mais atrasada e Macau vai ter que continuar a adiar o futuro enquanto a SAJ faz experiências a criar e extinguir organismos até chegar a uma solução. E por último, quem paga a “factura” é sempre o povo!

 

E, no meio de tantas experiências, a SAJ continua sem ser responsabilizada pelo rotundo fracasso das suas medidas e pelos seus maus resultados, continuando com autoridade e recursos para gerir a justiça como bem entende, ignorando propostas bem mais sensatas e práticas como as avançadas recentemente por exemplo pelo Vice Presidente da Assembleia Legislativa (AL), que defende – e bem – um sistema de maior autoridade e relevo do CE na coordenação e aceleração do processo legislativo. Aliás, é minha opinião, que o Gabinete do CE já mostrou em pouco tempo, ter suficiente capacidade técnica e vontade renovadora para assumir estas responsabilidades.

 

Por fim, será que é prudente continuar a confiar à SAJ a tarefa de resolver os erros que ela própria cometeu, quando esta já mostrou não estar à altura da tarefa? Em especial quando não tem junto da comunidade política e da sociedade civil a credibilidade necessária para se assumir como uma reformadora da justiça?

 

E quando esta nova experiência da SAJ falhar, que se fará? Volta-se a separar o GRJ e o GADI? Funde-se a nova Direcção de Serviços com outra qualquer?

 

Face aos maus resultados apresentados pela SAJ no seu pelouro, e num quadro de grande desgaste político e antipatia geral da sociedade civil para com a SAJ, não será altura do Governo exigir do topo do Governo efectivas medidas de responsabilização e credibilização da por parte da SAJ? Não será mais fácil e com muito menos custos aos cofres do erário público substituir o cargo de Administração e Justiça por uma outra qualquer pessoa mais competente?

 

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 10 de Novembro de 2010.

 

José Pereira Coutinho

 

 

 

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