INTERPELAÇÃO ESCRITA
“Fundamentação do ajuste directo para o sistema de circulação da Linha Leste do Metro Ligeiro da RAEM”
No dia 30 de Abril deste ano, questionei por escrito a adjudicação por ajuste direto do sistema de circulação da Linha Leste do Metro Ligeiro à empresa japonesa Mitsubishi Heavy Industries, uma empresa japonesa do Grupo Mitsubishi, com origens em 1884, fundada por Yatarō Iwasaki, e com sede em Tóquio, no Japão, pelo valor global de 3,657 mil milhões de patacas, e com conclusão prevista para 2029.
Nessa interpelação, referi que desde Janeiro de 2020, menos de um mês após a entrada em funcionamento da Linha da Taipa, se tinha registado a primeira falha nos cabos elétricos, tendo ocorrido 18 avarias em menos de dois anos, com a agravante de ter sido necessário substituir todos os cabos elétricos, resultando na suspensão dos serviços durante mais de 5 meses.
Mais referi, na citado questionamento escrito, que a 28 de Dezembro de 2023, foi divulgado o Relatório de Auditoria de Resultados do Comissariado de Auditoria, que apontou "Falhas no cabo elétrico da Linha da Taipa do Metro Ligeiro", solicitando que os serviços competentes encarassem esses problemas com seriedade, revendo as insuficiências, clarificando as respectivas responsabilidades e acompanhando o assunto de forma rigorosa.
Na minha supracitada interpelação escrita, mencionei também que o sistema de circulação do Metro Ligeiro de Macau está equipado com pneus de borracha, semelhante a outros projectos implementados no interior da China, e noutros países do Sudeste Asiático e na Europa.
A Mitsubishi Heavy Industries não é a única empresa que fornece este tipo de sistema. Na Alemanha, França, na R. P. da China, na Coreia do Sul e no Japão, existem outros fornecedores que poderiam assumir a construção do Sistema de Metro Ligeiro de Macau. Além disso, a Mitsubishi Heavy Industries possui um histórico de avaliação negativa do seu trabalho. Existem várias outras empresas, em muitos países, inclusive na R. P. da China, com capacidade de fornecer o mesmo sistema de circulação.
O Governo decidiu adjudicar o sistema de circulação da Linha Leste do Metro Ligeiro da RAEM à Mitsubishi Heavy Industries, por ajuste directo, sem realizar uma consulta pública, não tendo sido prestados esclarecimentos suficientes sobre esta decisão de adjudicação, nem sobre a possibilidade de outras empresas participarem no referido projeto.
De acordo com as informações disponíveis, o custo da construção do sistema de circulação da Linha Leste, incluindo o fornecimento de veículos, é de aproximadamente 300 milhões de patacas por quilômetro. Considerando que o comprimento total da Linha Leste é de 7,65 quilômetros, e que não havendo necessidade de o empreiteiro fornecer mais veículos, o preço de adjudicação não deveria ultrapassar os 2 mil milhões de patacas. Portanto, o preço da adjudicação é muito mais elevado do que o que outras empresas, com semelhante capacidade, poderiam oferecer para a realização da obra.
Não tendo havido um concurso público internacional, e tendo o sistema de circulação da Linha Leste do Metro Ligeiro da RAEM sido adjudicado por ajuste direto à empresa Mitsubishi Heavy Industries, esta decisão resultou na perda de oportunidades de negociação e comparação de preços com outras empresas.
Actualmente, e apenas em relação à Linha Barra-Taipa, que já está em funcionamento, há margem para negociação de preços e comparação entre três empresas. No entanto, a adjudicação por ajuste directo da Linha Leste, acabou com a possibilidade de participação de outras empresas na construção do sistema de Metro Ligeiro de Macau, tendo resultado no monopólio da Mitsubishi Heavy Industries, em Macau, e na perda de iniciativa e de alavancagem do Governo na negociação de preços para as novas linhas do Metro Ligeiro, na RAEM.
No dia 30 de Maio de 2024, o Director da Direcção dos Serviços de Obras Públicas respondeu o seguinte, por escrito, à minha interpelação:
a) A Linha da Taipa, que utiliza os sistemas em questão, entrou em funcionamento em 2019, ou seja, há menos de 5 anos. Portanto, a introdução de uma nova tecnologia de sistema de circulação implicaria a necessidade de substituir todos os equipamentos e sistemas em funcionamento ou em instalação, devido à ausência de compatibilidade entre sistemas diferentes. Isso equivaleria a uma reposição da Linha da Taipa, da Linha de Seac Pai Van e da Linha de Hengqin, envolvendo um enorme custo para o erário público;
b) Caso fosse considerada a introdução de apenas um novo sistema independente para a Linha Leste, seria necessário criar um outro parque de materiais, oficina e centro de controle. Devido à escassez de recursos de solos em Macau, seria difícil reservar espaço para esse fim;
c) Em termos operacionais, a gestão, o controle e a rotina do pessoal responsável pela manutenção de dois sistemas diferentes seriam complicados, podendo implicar a necessidade de multiplicar o respectivo número de funcionários;
d) Além disso, a introdução do novo sistema necessitaria de assegurar a sua articulação com o sistema existente, a fim de garantir o bom funcionamento e a segurança dos passageiros.
Neste contexto, solicito ao Governo, que me sejam dadas respostas, de uma forma CLARA, PRECISA, COERENTE, COMPLETA, e em tempo útil, às seguintes questões:
1. Que tipo de estudos e relatórios especializados foram efectuados pelas autoridades competentes ou requeridos a empresas especializadas, quer internacionais, quer do interior do continente, para apoiar a análise aprofundada quanto à compatibilidade entre sistemas diferentes e auxiliar na subsequente tomada de decisão por parte do Governo para que a adjudicação fosse efetuada por ajuste direto à Mitsubishi Heavy Industries? Qual o valor global dos custos pagos pelos estudos, relatórios e trabalhos de consultadoria acima referidos? Quais foram as principais conclusões desses estudos e relatórios sobre a compatibilidade entre os sistemas?
2. Que entidades públicas e privadas, internacionais, regionais ou do interior do continente, foram consultadas para chegar à conclusão de que nenhuma das empresas fornecedoras, quer no interior da China, quer nos países do Sudeste Asiático e até mesmo empresas fornecedoras sediadas nos países europeus, estariam tecnicamente capacitadas para fornecer o sistema de circulação da Linha Leste do Metro Ligeiro da RAEM? Que estudos de viabilidade técnica e económica foram realizados para fundamentar a informação da necessidade de substituição de todos os equipamentos e sistemas em funcionamento ou em instalação, devido à ausência de compatibilidade entre sistemas diferentes? Tendo em consideração que toda a Linha Leste do Metro Ligeiro é composta por estações subterrâneas e túnel escavado por tuneladoras, sendo obras difíceis de executar no subsolo e debaixo do mar, e que os preços dos materiais e o salário dos trabalhadores da construção em Macau são mais baratos do que no Japão, quais as razões de terem sido afastadas do concurso as empresas do interior do continente ou terem optado pela Mitsubishi Heavy Industries, pagando quase o triplo dos valores praticados pelas empresas do interior do continente?
3. Quais as razões preponderantes de o Governo de Macau não ter ponderado um concurso público internacional condicionado, com o objetivo de comparar preços e atender às sugestões do Comissariado de Auditoria e às opiniões dos cidadãos? Esse tipo de concurso público permitiria evitar custos astronômicos e extremamente irrazoáveis, além de possibilitar a comparação da capacidade técnica de execução das empresas concorrentes. Que outras alternativas foram consideradas pelo Governo além da adjudicação à Mitsubishi Heavy Industries? Que documentação ou informações adicionais poderá o Governo fornecer para esclarecer o processo de tomada de decisão? Não devria o ajuste directo ser considerado como último recurso e como forma excepcional de adjudicação por terem sido esgotadas todas as outras formas mais transparentes de contratação pública?
O Gabinete do Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 09 de Julho de 2024.
José Pereira Coutinho