INTERPELAÇÃO ESCRITA
“O sistema de carreira dos “Funcionários da Justiça em Macau” deve ser revisto para garantir uma promoção e progressão justa e satisfatória para todos os profissionais deste sector”
Vivemos num mundo globalizado, complexo e mais exigente, no qual as instituições públicas são obrigadas a modernizar-se, e a tornar-se mais eficientes para enfrentar os desafios de uma realidade cada vez mais dinâmica, com altos níveis de exigência de rigor e transparência.
A crise económica e social que atinge os países em todo o mundo tem aprofundado a mudança do contexto social e por consequência afectado o funcionamento do sistema judicial, que enfrenta, na actual conjuntura, fenómenos de vária ordem, de onde se destacam o aumento das desigualdades sociais, a emergência de novos riscos públicos, a maior organização individual e colectiva e o aumento do activismo dos cidadãos, e alterações, quantitativas e qualitativas, na procura sociojurídica, que pressionam o sistema judiciário a aceitar novos desafios e a novas funções, e que têm resultado em problemas básicos com o aumento excessivo de processos, morosidade e falta de acesso à justiça, prejudicando aqueles que buscam a reparação ou a protecção de seus direitos.
A Convenção Européia para Protecção dos Direitos e Liberdades Fundamentais estabeleceu, no seu art. 6º, § 1º, referente ao Direito a Um Processo Equitativo, que “...qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela..., deixando claro que a “...Justiça que não cumpre as suas funções dentro de um prazo razoável é para muitas pessoas uma Justiça inacessível...”, sendo portanto fundamental que o Poder Judiciário seja acessível ao cidadão.
A Justiça deve deixar de ser elitista, hermética e excessivamente técnica, e todos os cidadãos devem ter a protecção do juiz, guardião dos seus direitos fundamentais e sociais.
Em Macau, tanto a Lei n.º 7/2004, que estabelece o Estatuto dos Funcionários de Justiça, como o Regulamento Administrativo n.º 30/2004, que estabelece o processo de recrutamento, selecção e formação dos funcionários de justiça, estão em vigor há cerca de duas décadas, sendo fundamental modernizar a organização interna dos recursos humanos e adaptá-los às significativas mudanças sociais que ocorreram nos últimos vinte e cinco anos da existência da RAEM. Essa modernização deve promover a economia processual, a simplicidade, a agilidade e a celeridade no sistema judiciário, dotando-o de estabilidade e de um corpo de profissionais mobilizados, dedicados, motivados e empenhados em todas as carreiras.
Para alcançar este objectivo, e considerando que a gestão dos funcionários de Justiça desempenha um papel crucial no sector Judiciário, através da qualidade do seu trabalho, das suas decisões, e da sua a imparcialidade, garantindo a aplicação da justiça e inspirando confiança nas instituições, é essencial proceder à reestruturação das carreiras actuais dos oficiais de justiça e assegurar que os seus direitos e interesses socioprofissionais estejam alinhados com a complexidade, volume e horas de trabalho realizadas, bem como com os níveis de exigência e celeridade que influenciam diretamente e indiretamente todo o sistema de administração da justiça.
Importa, no entanto, registar que os servidores do sistema judiciário enfrentam regularmente situações complexas, devido à natureza do trabalho judicial, desafiante e de elevado grau de exigência emocional, devido à natureza das questões jurídicas e à responsabilidade de tomar decisões que afectam directamente a vida das pessoas, que poderão resultar em situações de exaustão e ter um impacto negativo na saúde mental dos profissionais envolvidos, pelo que é fundamental que sejam disponibilizadas condições de apoio adequado para lidar com estas situções, incluindo programas de bem-estar, serviços de aconselhamento e um ambiente de trabalho que promova o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.
Compreender estes desafios é essencial para promover um ambiente de trabalho saudável, e atrair e reter talentos qualificados. No entanto, frequentemente, os necessários recursos e programas adequados para o desenvolvimento profissional contínuo, e permanente, destes funcionários judiciais, não são disponibilizados. A falta de investimento na formação profissional contínua pode resultar numa força de trabalho desactualizada e menos habilitada para lidar com os desafios emergentes, pelo que só através da capacitação adequada do Poder Judiciário para o cumprimento da sua missão será possível garantir a qualidade das decisões judiciárias para todos os cidadãos.
Neste contexto, e tendo em consideração que o sistema de carreira dos funcionários da justiça em Macau deve ser revisto para garantir uma promoção e progressão justa e satisfatória para todos os profissionais deste sector, sendo fundamental que sejam estabelecidos critérios claros e transparentes, assegurando a valorização do mérito e da experiência, e garantindo também a formação contínua e o desenvolvimento profissional dos funcionários, bem como um sistema de avaliação justo e equitativo, solicito ao Governo, que me sejam dadas respostas, de uma forma CLARA, PRECISA, COERENTE, COMPLETA, e em tempo útil, às seguintes questões:
1. Tendo em conta que a Lei n.º 7/2004, que estabelece o Estatuto dos Funcionários de Justiça bem como o Regulamento Administrativo n.º 30/2004, que estabelecem o processo de recrutamento, selecção e formação dos funcionários de justiça, estão em vigor há cerca de duas décadas, sendo fundamental modernizar a organização interna dos recursos humanos e adaptá-los às significativas mudanças sociais que ocorreram nos últimos vinte e cinco anos da existência da RAEM. Essa modernização permitirá promover a economia processual, a simplicidade, a agilidade e a celeridade no sistema judiciário, dotando-o de estabilidade e de um corpo de profissionais mobilizados, dedicados, motivados e empenhados em todas as carreiras. Assim que medidas específicas irá o Governo da RAEM adoptar para reestruturar as carreiras dos trabalhadores da Justiça, e como irá esta reestruturação afectar os benefícios e progressões na carreira dos trabalhadores da Justiça?
2. Que metodologia irá o Governo da RAEM utilizar para atrair e reter talentos qualificados neste sector, tendo em consideração a complexidade, responsabilidades, natureza das funções e volume de trabalho, bem como a necessidade de promover a celeridade e agilidade processual das suas funções? Quais são os critérios específicos justos e transparentes que serão levados em consideração para actualizar os índices da tabela remuneratória, nomeadamente da carreira de oficial de justiça judicial e de carreira de oficial de justiça do Ministério Público e acordo com a complexidade, graus de exigência e rigor?
3. Irá o Governo actualizar e modernizar o processo de recrutamento, selecção e formação para ingresso e acesso às carreiras de oficial de justiça judicial, e de oficial de justiça do Ministério Público, e para o provimento de cargos de secretário judicial, secretário judicial-adjunto e escrivão de direito, previstos no Regulamento Administrativo n.º 30/2004, adaptando a sua implementação às novas tecnologias e realidades sociais? Que medidas concretas e eficazes irão ser implementadas para reduzir a morosidade processual, e simplificar, agilizar e promover uma maior celeridade no sistema de Justiça?
O Gabinete do Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 12 de Março de 2024.
José Pereira Coutinho