ATFPM DIRECÇÃO

JOSÉ PEREIRA COUTINHO

Deputado à Assembleia Legislativa e Presidente da Direcção da ATFPM

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INTERVENÇÃO ANTES DA ORDEM DO DIA

 

Nos termos do artigo 25.º do Estatuto do Deputado, os Deputados não respondem pelas declarações e votos que emitam nas reuniões da Assembleia Legislativa.

Senhor Presidente, apenas recordo esta importante garantia das imunidades dos Deputados porque esta minha intervenção vai centrar-se em aspectos relativos ao futuro processo eleitoral de 17 de Setembro e a determinadas tomadas de posição da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL).

Não vou aqui fazer propaganda eleitoral, expressa ou implicitamente. Nem vou pronunciar-me sobre candidaturas.

Venho antes cumprir solenemente com o meu dever de observar rigorosamente e defender a Lei Básica, as leis de demais actos normativos vigentes na RAEM nos termos da alínea 4) do artigo 38.º do Estatuto do Deputado.

Relembro que a Lei Básica garante nos seus artigos 26.º, 27.º e 40.º diversos direitos e liberdades fundamentais, em especial o direito de eleger e de ser eleito.

Nestes termos é com muita preocupação e apreensão que tomo conhecimento de notícias públicas segundo as quais a Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa parece ter a intenção de que os carros de campanha venham a poder circular apenas em ruas previamente definidas tratando-se de uma medida que visará evitar demasiado ruído na via pública durante a campanha. A decisão sobre quais as ruas em que os carros estarão autorizados a circular vai ser tomada mediante sorteio.

A ser assim julgo que se irá verificar o desrespeito pela Lei Básica e a violação de várias leis aprovadas por esta Assembleia Legislativa.

Em causa, caso se confirme esta intenção da CAEAL, está uma limitação inaceitável, injustificável e perigosa de direitos fundamentais consagrados para o exercício do processo eleitoral e a violação de norma legal.

Com efeito, o artigo 78.º da Lei n.º 3/2001 que fixa o regime eleitoral para a Assembleia Legislativa dispõe expressamente que:

    «Artigo 78.º (Propaganda sonora)

1. A propaganda sonora não carece de autorização das autoridades administrativas, mas deve ser comunicada nos termos do artigo 75.º B.

2. Sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo anterior, não é admitida propaganda sonora antes das 9 ou depois das 23 horas.»

Daqui resulta que a CAEAL não tem competência legal nem forma para estabelecer regras que restrinjam ou limitem este direito de propaganda sonora.

A propaganda eleitoral recorre tradicionalmente, entre outros meios, à propaganda sonora através, nomeadamente, do uso de veículos com sistemas de som instalados percorrendo livremente as vias públicas de modo a poderem divulgar e difundir a sua mensagem ao eleitorado. Apelando ao cumprimento do dever cívico de votar nas eleições, anunciando, por exemplo, locais e horas de actividades de campanha e divulgando o seu programa eleitoral.

É bem verdade que nos termos do n.º 2 deste artigo 78.º a lei já impõe uma limitação não admitindo «propaganda sonora antes das 9 ou depois das 23 horas.». Esta é a única restrição legal admissível à propaganda sonora.

Bem sei que algumas vezes esta propaganda sonora pode provocar algum incómodo a algumas pessoas.

Senhor Presidente e senhores Deputados, este é o custo, pequeno e limitado no tempo, duas semanas de 4 em 4 anos, de Macau ter eleições livres e honestas.

Na nossa cidade, anualmente durante aproximadamente uma semana, decorre o Grande Prémio de Macau que origina mais ruído, encerramento ao trânsito de várias ruas no centro da cidade que se traduzem em um transtorno claramente superior com aquele que pode resultar da propaganda sonora eleitoral.

No cumprimento do direito de reunião e manifestação também se produz ruído e este ruído é permitido porque é necessário a qualquer manifestação e está protegido pelo artigo 27.º da Lei Básica, pela Lei n.º 2/93/M, que é a lei que regula o direito fundamental de reunião e manifestação, e, no caso da liberdade de reuniões e manifestações eleitorais, pelo artigo 77.º, n.ºs 3 e 6, da Lei eleitoral para Assembleia Legislativa.

Recordo aqui Senhor Presidente e senhores Deputados que no Parecer N.º 3/V/2014 da 1.ª Comissão Permanente, sobre a Proposta de Lei intitulada «Prevenção e controlo do ruído ambiental» se afirma que a Lei n.º 2/93/M, de 17 de Maio «relativa aos direitos fundamentais de reunião e de manifestação não poderá, e não será, pois, afectada» com a Lei n.º 8/2014 relativa à «Prevenção e controlo do ruído ambiental.».

Neste mesmo parecer afirma-se que não se devem criar outras restrições através duma lei geral e refere-se que «O Governo concorda claramente com o ponto de vista da Comissão, e referiu que a presente proposta de lei não significará qualquer revisão, mesmo que indirecta, das normas relativas aos direitos fundamentais de reunião e manifestação.»

Acresce ainda que não é por uma simples instrução da CAEAL, que nem sequer é publicada no Boletim Oficial, que se pode introduzir quaisquer modificações, limitações ou alterações a normas legais aprovadas por esta Assembleia Legislativa como manda a Lei Básica e a Lei n.º 13/2009 que estabelece o regime jurídico de enquadramento das fontes normativas.

Lembro ainda que por se tratar de matéria de por se tratar de matéria de direitos fundamentais apenas a lei da Assembleia Legislativa é que pode criar restrições aos direitos fundamentais. Tal resulta claramente do artigo 6.º, alínea 1) e 4), da Lei n.º 13/2009.

Uma outra questão que me inquieta, entre outras, é a instrução da CAEAL que obriga à remoção de todas as informações da internet cujo conteúdo possa dirigir a atenção do público para um determinado candidato.

É com preocupação que alerto, que pela própria natureza da internet, não é possível aos candidatos removerem todas as informações em causa. Na realidade qualquer pessoa pode colocar esta informação na internet, sem que o candidato disso tenha conhecimento ou possa impedir.

Também aqui se trata de matéria de direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa que apenas podem ser limitadas ou restringidas por lei desta Assembleia Legislativa e nunca por meras instruções.

Senhor Presidentes e senhores Deputados, perante tudo isto, faço aqui um apelo formal na minha qualidade de Deputado para que a CAEAL pondere devidamente estas questões e não aprove instruções ilegais e violadores da Lei Básica e de leis da Assembleia Legislativa.

A minha consciência não me permite ficar calado perante estas notícias tão preocupantes.

Senhor Presidente e colegas, devemos todos apelar em conjunto pelo cumprimento rigoroso da Lei Básica e pelo respeito pelas leis da Assembleia Legislativa e assim alcançar um processo eleitoral justo, honesto e transparente que respeite plenamente o direito de eleger e de ser eleito, como exige o artigo 26.º da Lei Básica.

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa

Especial de Macau aos 09 de Agosto de 2017.

 

 

 

José Pereira Coutinho

 

 

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