INTERPELAÇÃO ESCRITA
Em Novembro de 2009, e aquando da apresentação das Linhas de Acção Governativas (LAG) para o Ano Financeiro de 2010 para a Àrea da Administração e Justiça, perguntei à Secretária para a Administração e Justiça (SAJ) quando procederia à modernização da legislação sobre o regime das despesas com obras e aquisição de serviços promulgada em 1984 ou seja um diploma que vigorava a mais de vinte e seis anos atrás.
Na altura tinha referido que os diplomas em causa, Decreto-Lei n.º 122/84 de 15 de Dezembro e D.L. n.º 30/89/M de 15 de Maio, estavam desactualizados, continham muitas lacunas, e não contribuíam para justiça e equidade dos concursos públicos e aquisição de bens e serviços quando processadas pelas entidades públicas. Na altura, perguntei à responsável máxima pela modernização legislativa, mas não obtive resposta.
Posteriormente, no dia 15 de Julho de 2010, voltei a interpelar, desta vez por escrito, porque é que mesmo após a descoberta do mega escândalo de corrupção do século em Macau cometida pelo Ex-Secretário para as Obras e Transportes, o Governo continuava por não modernizar e adaptar a legislação nomeadamente o Decreto-Lei n.º 122/84 de 15 de Dezembro que estão desactualizados, contêm muitas lacunas, e não contribuem para justiça e equidade dos concursos públicos e aquisição de bens e serviços quanto processadas por muitos serviços públicos. Ainda referia na dita interpelação escrita que os atrasos na modernização legislativa permitiam a ocorrência fácil de abusos e corrupção para além da concorrência desleal entre as empresas que conseguem traficar influências.
No dia 14 de Setembro de 2010, o ex-Director dos Serviços de Administração e Função Pública, respondendo a minha supracitada interpelação escrita, afirmava o seguinte: “o Governo da RAEM está a proceder aos trabalho de revisão do Decreto-Lei n.º 122/84 de 15 de Dezembro com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 30/89/M de 15 de Maio (regime das despesas com obras e adquisição de serviços) por forma a responder efectivamente às exigências do desenvolvimento social.”
Mais afirmava o ex-Director dos Serviços de Administração e Função Pública na resposta à minha interpelação escrita que para além dos trabalhos de revisão da legislação acima mencionada, a promoção da integridade tem sido sempre uma prioridade tida em grande consideração nas acções do Governo da RAEM. Com base no Decreto-Lei n.º 122/84 e no Código do Procedimento Administrativo, o Governo da RAEM tem adoptado várias medidas tendentes ao aperfeiçoamento do regime de aquisição de bens e serviços a fim de garantir a legalidade, a justiça e a transparência nos processos de aquisição pública.”
No dia 16 de Outubro do corrente ano, ou seja volvidos mais de seis anos da minha interpelação escrita, o Comissariado Contra a Corrupção (CCAC) apresentou ao Chefe do Executivo o “Relatório de investigação sobre a adjudicação de serviços de gestão de auto-silos públicos por parte da DSAT”
Nesse relatório, o CCAC afirma que “Segundo a experiência do CCAC no âmbito do combate à corrupção, a aquisição de bens e serviços públicos é uma das áreas facilmente susceptíveis de apresentar riscos de corrupção. No passado, o CCAC detectou vários casos em que os trabalhadores de função pública, em conluio com comerciantes, aproveitaram as suas competências funcionais para obter benefícios ilícitos em processos de adjudicação de bens e serviços.” O Relatório conclui por recomendar que “a Administração Pública deve, tendo em consideração a realidade do desenvolvimento social da RAEM, proceder a uma revisão e melhoria atempada do Decreto-Lei n.° 122/84/M e de demais legislação aplicável, reforçando os mecanismos de fiscalização e controle, a par da simplificação do processo de aquisição de bens e serviços públicos.”
Recorde-se que em Janeiro do corrente ano, o Comissariado de Auditoria, apresentou um relatório quanto à adjudicação de serviços de consultadoria, de estudos e de sondagens de opinião, referindo o seguinte: “nas adjudicações efectuadas pelos serviços públicos verificaram-se situações de abuso na aplicação das disposições relativas à dispensa de concurso e ao ajuste directo, com dispensa de consulta a três entidades, dispensa de consulta escrita ou da celebração de contrato escrito, previstas no Decreto-Lei nº 122/84/M de 15 de Dezembro, “Regime das despesas com obras e aquisição de bens e serviços” na medida em que foram utilizados fundamentos como a capacidade, a experiência e os conhecimentos profissionais do fornecedor ou as circunstâncias particulares urgentes, para facilitar o processo de adquisição, contrariando, assim o espírito da lei sobre a aplicação da dispensa.”
A Auditoria refere ainda mais que “os serviços públicos colocam a conveniência da própria operação à frente dos interesses da população em geral e da eficácia da aplicação dos dinheiros públicos. Em termos práticos, nas aquisições de serviços de elevado valor e de impacto profundo os serviços públicos não consultam fornecedores suficientes, donde não actuam em conformidade com critérios racionais, sensatos, coerentes e benéficos para o interesse do Governo da RAEM.” E que “nas verificações de auditoria foi detectado que os serviços públicos fazem interpretações diferentes dos diplomas legais autorizando despesas para as quais fazem interpretações diferentes dos diplomas legais, autorizando despesas para as quais não tem competência.”
Assim sendo, interpelo o Governo, solicitando, que me sejam dadas respostas, de uma forma CLARA, PRECISA, COERENTE, COMPLETA e em tempo útil sobre o seguinte:
1. Na sequência dos relatórios apresentados pelo CCAC e CA respeitante ao cumprimento do Decreto-Lei n.º 122/84 de 15 de Dezembro e legislação pertinente, vai o Governo apurar o grau de responsabilidade das tutelas directamente responsáveis dos serviços públicos e envolvidas na errada interpretação das normas legais pelos serviços públicos e uso abusivo de circunstâncias especiais para subtraírem aos procedimentos legais nos termos da alínea 5) do artigo 3.º e da alínea 1), alínea 4) e alínea 5) do artigo 4.º e alíneas 1) e 2) do artigo 6.º do Estatuto dos titulares dos principais cargos da RAEM publicado pelo Regulamento Administrativo n.º 24/2010?
2. Nos termos do n.º 1 do artigo 9.º das Normas de Conduta dos Titulares dos Principais Cargos da RAEM publicado pela Ordem Executiva n.º 112/2010 de 21 de Dezembro, qual o resultado dos mecanismos adequados de avaliação para superintender os serviços subordinados quanto ao uso eficaz de recursos financeiros do erário público para evitar a prática de actos que violam o princípio da legalidade e abuso de poderes públicos tais como foram referenciados nos relatórios de Janeiro e Outubro do corrente ano respetivamente pelo Comissariado de Auditoria e de Contra a Corrupção?
O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 04 de Novembro de 2016.
José Pereira Coutinho