INTERVENÇÃO ANTES DA ORDEM DO DIA
Este é o primeiro Plenário de 2014. O ano de 2014 será o ano de recondução do mandato do actual Chefe do Executivo. Recordamos que em 2009, o actual Chefe do Executivo através da sua Plataforma de Candidatura prometeu o seguinte: “É indispensável encorajar vigorosamente a adequada diversificação económica, reformar a administração pública e construir um governo limpo, honesto e eficiente o que constitui não somente uma base para melhorar a legalidade como também uma articulação decisiva para elevar a qualidade dos serviços.”
Volvidos cerca de 5 anos, a RAEM continua cada vez mais dependente das receitas do Jogo e a diversificação económica mais parece uma “miragem” do deserto. As pequenas e médias empresas tradicionais sofrem enormes dificuldades de sustentabilidade face aos elevados preços de arrendamento. Nos últimos (5) cinco anos, a reforma na administração pública cingiu-se a meros remendos na legislação deixando muitos problemas por resolver. Talvez se considere reforma da administração pública a recente proposta de dupla actualização de vencimentos dos titulares dos principais cargos, compensação pecuniária de milhões de patacas pelo exercício das referidas funções e a subvenção vitalícia.
Relativamente à construção do governo limpo, honesto e eficiente, a RAEM não figura nem sequer nos primeiros (50) lugares, onde a Singapura ocupa o 5º lugar e a RAEHK o 15º lugar. De acordo com a “ Corruption Perceptions Index 2013” a Nova Zelândia e a Finlândia lideram o “ranking”, seguidos da Suécia, Noruega e Singapura. Este baixo posicionamento tem a ver com a falta de responsabilidade de alguns titulares dos principais cargos, o despesismo das verbas públicas, a falta de transparência governativa e ineficiência da máquina administrativa que são alguns dos principais problemas de governação e que afectaram a imagem da RAEM nos últimos 5 anos.
O Chefe do Executivo também prometeu o seguinte em 2009 através da sua Plataforma de Candidatura “Unificaremos os direitos e as obrigações dos funcionários públicos, para que qualquer um deles seja justamente tratado e beneficiado, sem distinção do seu departamento nem do regime de nomeação.”
Nos últimos 5 anos, o Governo foi prolífero na discriminação dos funcionários. Um simples exemplo serve para perceber melhor a discriminação maciça dos trabalhadores nomeadamente no tocante ao regime de destacamento, transferência e requisição que só são operadas com sucesso desde que haja “padrinhos” ou “madrinhas” enquanto à maioria dos trabalhadores lhes é vedado o sistema.
Mas há muitos mais tipos de discriminação em função da “protecção” que tenham e que resulta na tomada de decisões no caso concreto ou “compadrio”. Há muitos casos, por um simples desleixo do dirigente este é imediatamente “escovado”, enquanto outros que cometem erros graves, mas devido ao “compadrio”, permanecem intacto nos lugares com protecção e direito de medalhas de louvor público. Recorde-se por exemplo o caso da ex-Subdirectora da Direcção dos Serviços de Finanças que por caso de um bule no valor de poucas centenas de patacas, adquirido após a hasta pública, foi-lhe instaurado um processo disciplinar e destituída do cargo de direcção. Da mesma forma foram instituídos processos disciplinares aos Presidente e Vice-Presidente do IACM por haver matéria em sede disciplinar que ainda estão a ser julgados no Tribunal.
O escândalo relacionado com o actual Comandante do Corpo dos Bombeiros, perante as graves irregularidades tornadas públicas pelo CCAC, o Secretário para a Segurança entendeu que não seria “conveniente” instaurar um processo disciplinar na sequência do relatório do CCAC. Afinal a Administração Pública age por critérios subjectivos e pessoais de conveniência? Muitos cidadãos perguntam quais os critérios na instauração de processos de averiguação e disciplinares para os cargos de dirigentes e chefias? Que critérios são estes de conveniência? Não estaremos aqui perante mais um caso de abuso de poderes públicos? Mas a responsabilidade não é só do Secretário para a Segurança mas também do Chefe do Executivo. Se não vejamos.
Nos termos do artigo 45º da Lei Básica, o Chefe do Executivo é o dirigente máximo da RAEM. Nos termos do artigo 354.º do ETFPM o Chefe do Executivo pode ordenar inquéritos e sindicâncias. O Chefe do Executivo pode inclusivamente ordenar processos de averiguações nos termos do artigo 357.º do referido Estatuto. O Chefe do Executivo, como dirigente máximo, não deve ficar alheio e impávido quanto à decisão do Secretário de Segurança sobre o incorrecto comportamento do Comandante do Corpo dos Bombeiros denunciado publicamente anos atrás e recentemente pelo Comissariado Contra a Corrupção. O que o Chefe do Executivo não pode “encolher os ombros” ou esquivar de assumir as responsabilidades legais acima referidas “chutando-as” para os Secretários.
O que é totalmente inaceitável por parte de um Chefe de Executivo, que por vontade subjectiva individual de conveniência do Secretário da Segurança não se apure a verdade dos factos por entidade idónea e independente nos termos do ETFPM. E este poder e competência pertence em última instância ao Chefe do Executivo para mandar averiguar a verdade dos factos em defesa do bom nome e imagem do Governo da RAEM.
Por isso, neste momento, muitos cidadãos estão muito preocupados e questionam como serão escolhidos os novos Secretários que entrarão em funções em 2014 face aos sucessivos escândalos que foram aparecendo desde o estabelecimento da RAEM envolvendo alguns dos titulares dos principais cargos públicos, por exemplo os escândalos de “Ao Man Long”, o caso das 10 sepulturas e a recente protecção apadrinhada do Secretário da Segurança ao Comandante do CB. Especula-se que algumas pessoas já foram convidadas para o exercício dos cargos de Secretários.
A escolha dos Secretários para o próximo mandato do Chefe do Executivo é importante e crucial para parar com a quebra da qualidade de vida dos cidadãos. Neste momento, os cidadãos sofrem com a poluição ambiental, elevado valor de rendas e preços de habitação, transporte públicos deficientes, falta de qualidade de saúde pública, falta de creches, asilos, trânsito caótico, administração pública podre deficiente por dentro, trabalhadores da administração pública sem garantias para aposentação e muitos mais problemas sociais. O Governo limita-se passar os cheques anuais de compensação pecuniária que vai aumentando de valor à medida que a qualidade de vida dos cidadãos vai deteriorando-se.
No próximo ano, vai haver a eleição do novo Chefe do Executivo e com a actual estrutura da Comissão Eleitoral, o actual Chefe Executivo vai continuar a governar a RAEM por mais 5 (cinco) anos. A população de Macau tem todo o direito de saber quais os critérios de escolha dos secretários que o Chefe do Executivo irá convidar para fazer parte do elenco governativo, porque não queremos que Macau continue nas mãos de alguns dos principais titulares que não têm capacidade nem competência para resolver os principais problemas de sobrevivência dos cidadãos de Macau.
É altura de acabar com o monopólio dos cargos de Secretários. É altura de haver uma mudança, é altura de dar os lugares aos jovens e formar os Talentos. A RAEM precisa de ter Secretários competentes para resolver os problemas dos cidadãos e não os que permanecem sempre dentro dos Gabinetes a “despachar” os documentos ignorando a realidade social e o sofrimento dos cidadãos.
O Deputado da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 02 de Janeiro de 2014.
José Pereira Coutinho