INTERPELAÇÃO ESCRITA
No Plenário do passado dia 23 de Junho, referi-me à questão dos apartamentos Four Seasons, propriedade da Venetian Cotai Limited e do recente artigo do The Wall Street Journal, sobre a potencial intermediação de um membro desta Assembleia e do Conselho Executivo num caso de corrupção.
O The Wall Street Journal é um jornal de renome a nível mundial, com uma circulação de milhões de exemplares por ano, e publicou no dia 7 do corrente mês uma notícia referente aos referidos apartamento, que põe em causa o bom nome da desta Assembleia e da própria RAEM.
De acordo com o texto jornalístico em causa, são feitas transcrições directas de dois emails enviados por um membro desta Assembleia ao então CEO do grupo Venetian, onde se pode ler que “alguém de elevada posição em Pequim” terá proposto ao membro desta Assembleia que haveria "uma maneira de obter as necessárias aprovações para permitir a venda dos apartamentos”. Nesse mesmo email, o membro desta Assembleia terá dito que “há um montante a ser acordado pelo Sr. Adelson [dono do grupo Venetian] para resolver os dois assuntos. O montante a ser pago para resolver o assunto dos apartamentos de hotel será pago a um agente depositário e entregue ao senhor após a aprovação oficial.” Esse valor, segundo outro email, seria de US$300 milhões.
Ora, esta peça jornalística contém citações directas de emails, datas, factos, nomes e locais onde supostamente foram realizadas reuniões e discutidos favores e pagamentos.
Em resposta, o membro desta Assembleia referiu publicamente que nenhuma irregularidade foi cometida e que os emails são retirados do seu contexto, ou seja, em nenhum momento negou a sua existência.
Na minha intervenção no passado dia 23 de Junho, pedi ao Chefe do Executivo, ao CCAC e ao Ministério Público para averiguarem o que se passou e investigarem o alegado nesta notícia, que circulou por todo o Mundo, e que, a ser verdade, pode consubstanciar a prática de um crime público, o que só pode, e deve, ser negado ou confirmado, no âmbito de uma investigação.
Ao que parece, o deputado desta Assembleia, eleito indirectamente pelo Governo, terá explicado o sucedido ao Chefe do Executivo e este declarou ontem que, na qualidade de Chefe do Executivo e responsável pelo Conselho Executivo, aceitou as suas explicações e que as compreende perfeitamente.
Ora, o Chefe do Executivo não pode ignorar que com estas declarações pode eventualmente estar a condicionar a potencial intervenção do CCAC e do Ministério Público, como pode eventualmente estar à violar o princípio da separação de poderes, já que se está a pronunciar sobre um eventual crime público e não apenas sobre a conduta política de um membro do Conselho Executivo. A não ser que o gabinete do Chefe do Executivo tenha feito uma investigação à situação que foi denunciada publicamente, caso em que deve divulgar os resultados dessa investigação para que a mesma seja devidamente esclarecida.
Por outro lado, seria muito interessante saber qual a explicação que o membro desta Assembleia terá dado ao Chefe do Executivo para a clara e inequívoca frase “há um montante a ser acordado pelo Sr. Adelson para resolver os dois assuntos (…) a ser pago (…) a um agente depositário e entregue ao senhor após a aprovação oficial.”.
Em que outro contexto o Sr. Adelson pagaria US$300 milhões para resolver um “assunto” que compreendia uma aprovação de algo que o Governo já tinha declarado que não iria dar? Que explicação aceitável poderá ter existido para declarações tão inequívocas e não negadas?
O referido deputado desta Assembleia Legislativa e membro do Conselho Executivo tem todo o direito à presunção de inocência, mas não deve indignar-se contra os seus colegas da Assembleia que pedem apenas que o assunto seja investigado, como deve acontecer num Estado de Direito. Aliás, se as acusações são absurdas e infundadas como alega, deveria ser ele a pedir que o assunto fosse sindicado pelo CCAC, para limpar o seu bom nome o desta Assembleia e da própria RAEM.
Assim sendo, interpelo o Governo, solicitando, que me sejam dadas respostas, de uma forma CLARA, PRECISA, COERENTE, COMPLETA e em tempo útil sobre o seguinte:
1. Foi a declaração pública do Chefe do Executivo feita com base apenas na versão que lhe foi contada pelo Dr. Leonel Alves ou, pelo contrario, foi feita com base numa investigação de natureza administrativa aos factos alegados pelo Wall Street Journal, e neste caso, quais as diligências efectuadas para apurar a verdade.
2. Se o facto do Chefe do Executivo “aceitar” as meras explicações verbais deste deputado e importante figura pública o iliba de qualquer “investigação” ou responsabilidade por parte das entidades competentes?
(a) Em caso de resposta positiva, não considera o Chefe do Executivo que a questão merece ser investigada pelo CCAC ou pelo Ministério Público, para benefício da imagem e bom nome desta casa e das instituições de Macau?
(b) Aproveitando este exemplo, poderá em situações semelhantes, qualquer outro individuo dirigir-se ao chefe do executivo para se “explicar” e, desse modo, evitar ser responsabilizado?
O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 26 de Junho de 2012.
José Pereira Coutinho