GILDA
ONTEM NA UNIVERVIDADE DE SÃO JOSE POR ZHOU JINGHAO
Sem democracia não há superpotências
A chave para a China se transformar numa verdadeira superpotência não reside na economia, mas antes na política, defendeu Zhou Jinghao, que falava ontem na Universidade de São José. Outro académico, Jean-Philippe Béja, considera que não se vislumbra, ainda, um caminho alternativo para a China
O crescimento exponencial da economia chinesa, que terá uma dimensão dez vez superior ao que tinha em 1978, não se traduziu numa ascensão da China ao nível de superpotência, defendeu ontem o académico Zhou Jinghao, no último dia da conferência ”1911-2011: Da revolução às reformas – Caracterizando os paradigmas de transição made-in-China”, organizada pela Universidade de São José. Para isso, faltará ainda um maior reconhecimento de direitos políticos. tais como a liberdade de expressão, alegou o docente dos colégios norte-americanos de Hobbart e William Smith.
“O sucesso económico da China nos últimos 30 anos já provou que o modelo chinês funciona. Mas será que esse modelo também ajuda a China a tornar-se numa superpotência? Este estatuto é reconhecido internacionalmente e não auto-imposto”, problematizou o professor, que assume o seu cepticismo em relação ao actual ‘status quo’ vigente em Pequim. “Na verdade, o sistema oficial de valores na China perdeu contacto com o povo e a credibilidade do Governo desceu abaixo de um nível mínimo. Há pouca confiança entre o Governo e os cidadãos comuns. O povo chinês perdeu a sua fé no seu próprio Governo devido aos grandes níveis de corrupção. A legitimidade de um Governo é construída na compatibilidade entre as necessidades das pessoas e aquilo que ele pode providenciar-lhes. A instabilidade social da China reflecte que o Governo não vai ao encontro das necessidades das pessoas. Por isso, é necessário que o Governo chinês partilhe ideias e valores com as pessoas, por forma a reforçar a sua legitimidade”, analisou Zhou Jinghao.
Para este professor radicado nos Estados Unidos da América, um país só pode ascender ao estatuto de superpotência se o seu sistema político for caracterizado por valores democráticos, sendo “incompatível manter a direcção feita por um partido, ao mesmo tempo que se introduz a democracia”. Segundo postulou, “uma sociedade verdadeiramente harmoniosa está fundamentada no sistema democrático, porque as democracias modernas garantem direitos individuais, moderam conflitos, regulam as disputas políticas e fazem com que os Governos sejam mais legítimos, melhorando as suas qualidades e garantindo as melhores formas para supervisionar as burocracias dos estados modernos, prevenindo ainda que os líderes abusem dos seus poderes”. Sem que haja democratização, “a China, que poderia desempenhar um papel enorme na cena internacional, vê esse papel resumido à ajuda financeira, em África e na Europa, em países como a Grécia”, apontou.
Feitas as críticas contundentes, Zhou Jinghao alegou que, ainda assim, “será melhor para a China que a reforma do sistema político seja feita dentro do actual sistema político, dado que o Partido Comunista Chinês [PCC] continua poderoso e não há partidos oposicionistas para competir com ele, pelo que será necessário continuar a usar o PCC como o veículo principal para levar a China em direcção ao futuro”. Se tal não acontecer e se “o PCC não estiver disposto a promover a democratização da China, as consequências podem materializar-se “num conflito doméstico, que não iria apenas resultar num caos interno, mas poderia escalar para conflitos internacionais”, argumentou Zhou Jinghao.
EM BUSCA DA DEMOCRACIA. Foi também sobre a “procura de democracia” na China, neste caso desde a morte de Mao Zedong, que falou Jean-Phillipe Béja. De acordo com este professor na Sciences-Po-Ceri, uma instituição sediada em Paris, “as várias estratégias adoptadas pelas forças pró-democráticas, que, como deve ser lembrado, não constituem um movimento organizado, não permitiram, ainda, a construção de um caminho alternativo para a China”. Em consequência disso, “o que os observadores intitulam de movimento pró-democrático não passa de uma constelação de activistas, que não estão em posição para criar uma organização política que possa mobilizar forças sociais”. Béja considera que, neste contexto, o PCC “pode estar tranquilo”, mas diz também que “não se pode deixar de reflectir quanto à reacção incrivelmente violenta que o Governo adoptou quando alguns apelos, vindos de forças desconhecidas, foram feitos para que se lançasse uma ‘revolução de jasmim’, no Inverno passado. Esses apelos levaram a que “milhares de polícias tenham sido mobilizados, os activistas tenham sido postos sob prisão domiciliária ou levados pelas autoridades e a palavra ‘jasmim’ tenha sido censurada na Internet”, descreveu o universitário francês.
A democratização foi um tema recorrente ao longo dos trabalhos do derradeiro dia da conferência da USJ. Gang Guo, professor de Ciências Políticas e Relações Internacionais na Universidade do Mississipi, falou sobre as tentativas do PCC em efectuar reformas no sentido de uma maior abertura política, mas mantendo intacta a sua nomenclatura. Esforços que se têm focado em “expandir os direitos dos cidadãos em termos de acesso à informação, participação cívica e supervisão” e que se consubstanciaram em “experiências de democracia a nível local”. Restará saber, no entanto, se a população “continuará a estar satisfeita com o ritmo das experiências democráticas e se o Estado-Partido poderá continuar a antecipar-se à falta de apoio popular através destas experiências e mudanças
jornal tribuna demacau sábado, 18 de junho de 2011 pág 05