Hoje Macau 19.1.2011
O par encapuçado da Mitsubishi
Metro | Pereira Coutinho está desiludido com “jogos pouco transparentes”
Aparentemente já nada há a fazer. A primeira fase de construção do Metro Ligeiro está adjudicada à Mitsubishi Heavy Industries por um valor estimado de 7,5 mil milhões de patacas. Contudo, o deputado da Assembleia Legislativa José Pereira Coutinho não se resigna àquilo que considera ser um processo “pouco transparente” e acusa o Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes (GIT) de ser “mentiroso”. Para o legislador, os comboios da Mitsubishi são os mais pesados e a empresa não tem qualquer solução para o problema da estrutura da Ponte Sai Van. Pereira Coutinho fala em valores superiores ao orçamentado e desilude-se pelo Governo ter sempre encoberto o GIT. Es- pecialistas internacionais sublinham que os cabos da ponte não respeitam as normas de segurança estrutural da China.
“Estou muito triste. Estamos perante algo pouco transparente, já que várias questões ficaram por responder e ninguém fez nada. Aliás, o secretário para os Transportes e Obras Públicas já tinha conhecimento da decisão quando esteve a discutir as LAG na Assembleia a 19 de Novembro”, reagiu assim o deputado José Pereira Coutinho, depois de ter divulgado ontem uma nota de imprensa na qual sintetiza o seu pensamento sobre a adjudicação do Metro Ligeiro à Mitsubishi.
Pereira Coutinho defende que todo este processo foi uma “mentira” e acusa o Gabinete para as Infra-estruturas de Transportes (GIT) de estar a enganar “escandalosamente” a opinião pública e os cidadãos de Macau. “O GIT só tem dito mentiras. Disse que o veículo da Mitsubishi é o mais leve e que portanto não seriam necessárias obras estruturais na Ponte Sai Van. É mentira”, acusou o deputado.
De acordo com o legislador, o sistema de guiamento da empresa obriga ao uso de pesados muros laterais e betão armado que aumentam significativamente o peso total do sistema e o fazem mais pesado em relação à concorrência da Bombardier e da Siemens. “A Mitsubishi apresentou o sistema mais pesado em relação à concorrência em cerca de 15%”, desvendou Pereira Coutinho que acusa de seguida: “Como explica a Mitsubishi concorrer sozinha quando todos tinham um parceiro chinês a concurso? Para mim, a Mitsubishi tem um parceiro, aqui de Macau, escondido e com muito poder.”
Coutinho relembrou ainda, no seu comunicado, que, segundo especialistas de reputação internacional, que os cabos da Ponte Sai Van não satisfazem as normas de segurança estrutural da China. “Enfim, com a adjudicação à Mitsubishi, o GIT está a tentar nos convencer que uma proposta que nada faz pela segurança e mais cara é melhor que uma proposta que se propõe a substituir todos os cabos da Ponte Sai Van e ainda assim é mais barata”, afirmou.
As interpelações de Pereira Coutinho sobre este assunto não tiveram eco no Governo, que nunca as respondeu. Para o deputado, trata-se de uma “luta inglória contra os poderes instalados”. “O procedimento administrativo intra-governamental poderá ter limitado a acção do Chefe do Executivo, a quem esta adjudicação terá sido entregue como um facto consumado. Apesar disso, manifesto a minha decepção com o facto do Governo ter permitido que o GIT se furtasse a responder à minha segunda interpelação”, disse.
Esta é uma obra que, segundo Pereira Coutinho, ultrapassa em mais de metade o que estava previamente orçamentado e isso é outro motivo para a população de Macau ficar apreensiva. “O que era para ser 440 mil milhões em 2009 vai já quase em um bilião de patacas. Não admira que seja um contrato tão cobiçado”, lançou.
O deputado afirmou também na sua missiva que a proposta da Mitsubishi apenas foi considerada mais baixa devido ao preço “anormalmente baixo” da sua proposta opcional para a manutenção. “O mais grave é que o GIT não vai exercer a opção de manutenção, cujo preço foi decisivo na adjudicação da Mitsubishi, já que terá pedido a um consultor de transportes de renome mundial a preparação de uma minuta de caderno de encargos para o concurso de Operação e Manutenção”, revelou.
E aliados na causa? Ninguém, até ao momento, quis juntar-se ao legislador na causa. “Os restantes deputados não me acompanham. Os democratas estão fora das questões técnicas e os restantes, sendo empresários, têm medo que isso lhes toque na pele. Sorriem mas ninguém quer comentar”, acusa.
O GIT reagiu às acusações de Pereira Coutinho dizendo que “que os critérios de avaliação deste concurso e respectivos factores de ponderação, bem como as fórmulas de cálculo em causa, tinham sido já previamente definidas no processo do concurso, sendo que ao longo do período do concurso, e antes da apresentação das propostas, não foram apresentadas pelos concorrentes questões relativamente aos critérios de avaliação” e salvaguardou que a segurança é ponto assente para os responsáveis da RAEM.
“A segurança de todo o sistema de Metro Ligeiro constitui uma prioridade para o Governo. Na implementação deste sistema, conforme as especificações do material circulante seleccionado resultante deste concurso público internacional, a Ponte de Sai Van será objecto de ajustes e melhoramentos tendo como base o projecto original dessa infra-estrutura”, adiantou o GIT em comunicado.
Seja como for o negócio está feito. São 234 milhões de patacas e equivalem a 5% do valor da primeira fase do sistema de metro ligeiro que vai ser implementado em Macau. A Mitsubishi entregou, entretanto, ao Governo da RAEM a caução final relativa à adjudicação do fornecimento do material circulante para o módulo número um do sistema. De acordo com um comunicado divulgado na altura pelo Governo, esta garantia bancária simboliza a “aceitação oficial” do Executivo em negociar com a Mitsubishi e chega dentro do prazo estipulado.
A primeira fase do projecto, que conta com 21 quilómetros e 21 estações, deve ficar concluída em 2014, conforme previsto em calendário, com um orçamento estimado em 7,5 mil milhões de patacas. As estimativas é que o novo transporte sirva mais de 14 mil pessoas por hora em cada sentido entre Macau e Taipa.