ATFPM DIRECÇÃO

JOSÉ PEREIRA COUTINHO

Deputado à Assembleia Legislativa e Presidente da Direcção da ATFPM

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 INTERPELAÇÃO ESCRITA

 

 

Como é cada vez mais notório, a política ambiental da RAEM necessita de uma renovação profunda, por forma a cumprir plenamente os seus objectivos de protecção do meio ambiente e melhoramento da qualidade de vida dos cidadãos.

 

As Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) são instalações fundamentais na prossecução desses objectivos mas, infelizmente, neste momento, são um exemplo paradigmático da desadequação da política ambiental da última década, e ainda pior devido à pesada herança de má governação na área do ambiente. 

 

Segundo relatórios que fui recebendo nos últimos meses, todas as ETAR implantadas na RAEM apresentam problemas graves, que passo a resumidamente descrever:

 

ETAR do Parque Transfronteiriço

A sua concepção foi sobredimensionada de forma inexplicável, ao ponto de neste momento operar apenas a cerca de 10/15% da sua capacidade real, com uma quantidade substancial de equipamento a sofrer deterioração devido à falta de uso, tudo a expensas da RAEM, sem que alguém tenha de assumir responsabilidades por esta prolongada situação.

 

ETAR do Aeroporto

Outro caso gritante de mau planeamento e gestão. Dada a sua proximidade geográfica da ETAR da Taipa, questiona-se até que ponto se justificaria sequer a sua construção, uma vez que o aeroporto não gera sequer caudal suficiente para permitir que se efectue uma das fases de tratamento dos resíduos. O resultado, é uma ETAR subaproveitada, operando apenas a menos de 30% da sua capacidade e sem conseguir sequer dar uso a parte substancial do seu equipamento e estrutura por manifesta falta de resíduos.

 

ETAR de Coloane

Foi projectada e construída sem que antes se tivesse realizado estudos aprofundados quanto ao tipo e quantidade de efluentes a serem nela tratados. O resultado foi a construção de uma ETAR duplamente desajustada às necessidades da RAEM, uma vez que é (i) sobredimensionada em relação às reais necessidades da sua área de implantação, operando a menos de 20% da sua capacidade real e (ii) não está preparada para tratar o tipo específico de resíduos que recebe.

 

ETAR da Taipa

As informações que recebi deixam-me profundamente preocupado, já que o actual operador (a quem foi adjudicado há pouco mais de um ano a operação e reabilitação desta ETAR) apresentou um preço anormalmente baixo (cerca de 70% abaixo do segundo preço mais baixo!). Segundo as informações que me foram fornecidas, este valor jamais permitirá a realização das obras de reabilitação e a prestação dos serviços que lhe foram adjudicados e que constam do Caderno de Encargos de que faz parte do Contrato.

 

A somar a tudo isto, o actual operador continua envolvido em acesa discussão com o Governo sobre a aceitação desta estrutura devido ao estado lastimável em que o anterior operador (CEI, i.e., a Companhia ETAR das Ilhas, Limitada) deixou esta ETAR. Ademais, o próprio Governo está em litígio com o referido antigo operador, devido a vários incumprimentos contratuais, designadamente, o de não ter reabilitado uma das linhas de tratamento a que estava contratualmente obrigado.

 

Por fim, convirá relembrar que a história da ETAR do Aeroporto ficará para sempre ensombrada pela intervenção ilegal do ex-Secretário das Obras Públicas Ao Man Long, na adjudicação da sua construção. De igual forma, a adjudicação da ETAR da Taipa em 2005 foi alvo de investigação no âmbito do mesmo processo judicial.

 

ETAR de Macau

É neste contexto que foi aberto em 31 de Março do presente ano o Concurso Público para “Modernização, Operação e Manutenção da ETAR da Península de Macau” representando uma excelente oportunidade de se reformular procedimentos e revitalizar toda a política ambiental da RAEM.

 

Esta ETAR é localizada na Península de Macau, na área da Areia Preta e foi a primeira instalação deste tipo em Macau, incorporando dois subsistemas de tratamento designados por: Fase Líquida e Fase Sólida. A Fase Líquida destina-se a tratar as águas residuais de toda a península de Macau e a Fase Sólida destina-se a eliminar as lamas produzidas em todas as ETAR da RAEM.

 

A ETAR está a ser operada pela empresa “ENGENHARIA HIDRAULICA DE MACAU LIMITADA”, detida pela sociedade VA TECH WABAG GMBH.

 

Situação Actual da ETAR de Macau

A Fase Liquida da ETAR foi concebida para tratar um caudal diário de 144,000 m3/dia, no entanto, de acordo com dados oficiais, no ano de 2009 a ETAR recebeu em média um caudal diário de ~167,000 m3/dia dos quais apenas ~72,400 m3/dia foram tratados. O restante caudal (~94,600 m3/dia) foi simplesmente descarregado no mar sem qualquer tratamento. Isto significa que a ETAR apenas tratou 43% do caudal afluente e que a cidade de Macau está, efectivamente, a poluir o meio ambiente. A situação actual de descarga de um caudal tão significativo de esgoto sem tratamento é grave e apresenta impactos negativos significativos na qualidade da água do meio receptor, com todas as implicações subjacentes para o ambiente e para a população humana.

 

Por outro lado, verifica-se que a instalação da Fase Sólida da ETAR tem problemas de emissão de gases poluentes não aceitáveis e o próprio governo da RAEM já se decidiu pelo seu abate e transferência do serviço para outra instalação.

 

A par destes problemas sérios em termos ambientais, existem ainda problemas de emissão de odores desagradáveis a partir da ETAR que apresentam um impacto negativo muito significativo na população que vive nas imediações da ETAR, que todos os cidadãos já tiveram, certamente, oportunidade de experimentar ao circular pela zona. Estes odores afectam, também, os turistas que entram pelas Portas do Cerco, pois a sua circulação à chegada e saída da RAEM faz-se obrigatoriamente por aquela zona.

 

As causas destes problemas prendem-se com: (i) deficiências de concepção da ETAR; (ii) envelhecimento das instalações; (iii) deficiente manutenção dos equipamentos pela actual operadora “ENGENHARIA HIDRAÚLICA DE MACAU LIMITADA”; e (iv) quase ausência de fiscalização por parte do Governo.

 

 

Concurso Público para a “Modernização, Operação e Manutenção da ETAR da Península de Macau”

 

Com grande atraso e prejuízo para o meio ambiente, o governo da RAEM lançou em Março 2010 um concurso designado “Modernização, Operação e Manutenção da ETAR da Península de Macau” que prevê diversas medidas que visam resolver os problemas associados à falta de capacidade e operacionalidade da ETAR, que, como já referi, causam graves impactos negativos sobre o ambiente da RAEM.

 

A sua resolução é extremamente urgente e não se pode repetir o que aconteceu com o concurso para a ETAR de Coloane na qual o governo levou cerca de um ano a decidir a adjudicação.

 

Por outro lado, espera-se que o Governo finalmente reflicta e analise as propostas dos concorrentes com base em princípios de rigor técnico, premiando a proposta que melhor garante a modernização e eficiente operação da ETAR de Macau, não cometendo o mesmo erro que cometeu com a ETAR da Taipa, em que adjudicou baseando-se apenas no preço aceitando uma proposta tecnicamente insuficiente.

 

Por fim, espera-se que o Governo da RAEM, (i) acelere o processo de adjudicação do concurso, resolvendo este grave problema ambiental (ii) adjudique ao concorrente que propôs as melhores soluções técnicas adequadas para a resolução dos actuais problemas da ETAR.

 

Assim sendo, interpelo o Governo, sobre o seguinte, solicitando, que me sejam dadas respostas, de uma forma clara, precisa, coerente, completa e em tempo útil sobre:

 

1. Quanto à ETAR da Taipa, pode o Governo garantir que as necessárias e urgentes obras de reabilitação na ETAR da Taipa serão levadas a cabo urgentemente pelo actual operador e que este, apesar do preço muito baixo da sua proposta, será instado a cumprir as suas obrigações, sem lugar a qualquer pagamento adicional?

 

2. Quanto ao concurso da ETAR de Macau, como tenciona o Governo evitar os erros do passado assegurar que a adjudicação será baseada numa ponderação equilibrada dos aspectos técnicos e financeiros das propostas, não caindo na tentação – infelizmente comum, e que se revelou tão danosa com a ETAR da Taipa – de adjudicar cegamente ao concorrente com o preço mais baixo? Que a adjudicação ocorrerá dentro do prazo de extensão do contrato por 6 meses, concedido ao anterior operador da ETAR de Macau?

 

3. O Governo criou a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) em Junho de 2009, com a intenção de reforçar a protecção ambiental na RAEM, mas os seus dirigentes têm-se visto impossibilitados de cumprir a sua missão, apesar dos seus bons esforços. Neste sentido, vai o Governo finalmente dotar a DSPA dos meios técnicos e financeiros que lhe permitam cumprir as funções de fiscalização ambiental que fazem parte da sua missão, de acordo com a sua própria Carta de Qualidade, seguindo por fim o exemplo de todas as jurisdições que primam pela responsabilidade ambiental?

 

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 19 de Outubro de 2010. 

 

José Pereira Coutinho

 

 

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