INTERPELAÇÃO ORAL
“QUALIDADE DA PRODUÇÃO JURÍDICA”
No Relatório das Linhas de Acção Governativa para o Ano Financeiro de 2010, na área da Justiça será impulsionada a produção e revisão legislativa de muitos e importantes projectos de diplomas legais.
De entre os projectos de diplomas anunciados destaco os seguintes:
- Em relação aos chamados “Grandes Códigos”, o Código Comercial, o Código de Processo Penal e o Código de Processo Civil;
- Quanto a outros códigos, o Código do Registo Comercial, o Código do Registo Civil, o Código do Registo Predial e o Código do Notariado;
- Relativamente a outra legislação importante, a Lei de Bases da Organização Judiciária, o “regime de garantia aplicável ao Chefe do Executivo e titulares dos principais cargos na sua aposentação ou desligação do serviço”, os “assuntos concretos da jurisdição sobre o pessoal da Guarnição em Macau”, o “regime de indemnização” a aplicar na Região Administrativa Especial de Macau, o Regime Jurídico sobre o Controlo de Material Pornográfico, bem como o Regulamento de Controlo de Material Pornográfico, o Regime de Combate aos Crimes de Violência Doméstica, o Regime de Protecção Social a Menores, o Regime Jurídico da Adopção e a cooperação judiciária regional em matéria penal;
- No âmbito do Regime Jurídico da Função Pública, incluem-se ainda o “regime de contratos”, “regime disciplinar”, “proposta de lei relativa ao apoio judiciário que oferece garantias aos trabalhadores da função pública no exercício de funções” e “regime de remuneração e abono”.
Contudo, tenho verificado que nos últimos anos, apesar do investimento que o Governo tem feito no âmbito da formação da “feitura de leis”, a qualidade da produção jurídica tem baixado significativamente.
Senão, vejamos.
Na anterior legislatura, o Governo teve de retirar a proposta de lei que visava baixar a idade da inimputabilidade criminal.
Inúmeras propostas de leis apresentadas tiveram de ser reelaboradas e foram apresentadas diversas versões, muitas delas com grandes diferenças em relação às propostas iniciais apresentadas pelo Governo, nomeadamente, a Lei n.º 7/2008 (Lei das relações de trabalho), a Lei n.º 13/2009 (regime jurídico de enquadramento das fontes normativas) em que foram apresentadas 4 versões, a Lei n.º 17/2009 (Proibição da produção, do tráfico e do consumo ilícitos de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas) em que foram apresentadas 2 versões, a Lei n.º 19/2009 (Prevenção e Repressão da Corrupção no Sector Privado) em que foi 1 nova versão completamente diferente e a Lei n.º 21/2009 (Lei da contratação de trabalhadores não residentes) em que foram apresentadas 2 versões.
Mais recentemente, a falta de qualidade e os problemas levantados pela definição de “Pensões Ilegais” na Proposta de Lei apresentada pelo Governo na AL para combater esse fenómeno!
Todos sabemos que o Governo possui nos seus quadros juristas de grande qualidade, bem como assessores muito experientes a trabalhar nos seus Gabinetes, e por isso, não se compreende porque razão as propostas apresentadas pelo Governo nos últimos anos são alvo de muitas alterações e correcções.
Todos sabemos que existem outros recursos humanos de qualidade na RAEM a exercer funções em outras entidades, nomeadamente, na Faculdade de Direito da Universidade de Macau, que podem colaborar com a Administração, nomeadamente, na elaboração de “pareceres jurídicos” externos que possam garantir uma análise e discussão objectiva e imparcial perante as “opções políticas” do Governo!
Todos sabemos que os “pareceres jurídicos” elaborados no âmbito da produção jurídica das propostas de leis não são enviados à Assembleia Legislativa e os deputados não têm acesso a esses documentos e por isso resulta uma grande perda de tempo e de muito trabalho na análise e discussão dessas propostas de leis nas Comissões Permanentes da AL!
Assim, interpelo o Governo sobre o seguinte:
1. Será que os Secretários e o pessoal de direcção e chefia que promovem essas iniciativas legislativas respeitam os “pareceres jurídicos” elaborados pelos seus técnicos?
2. Será que os Secretários e o pessoal de direcção e chefia respeitam a autonomia técnica dos juristas na elaboração dos “pareceres jurídicos” e não interferem no sentido e redacção das normas jurídicas? Será que os Deputados na AL podem ter acesso a esses “pareceres jurídicos” para facilitar os trabalhos de análise e discussão das propostas de leis nas Comissões Permanentes na AL?
3. Quais são os mecanismos que o Governo vai utilizar para garantir a qualidade da produção jurídica e o respeito dos princípios e valores fundamentais consagrados no sistema jurídico da RAEM na elaboração dos projectos de diplomas legais anunciados, nomeadamente, nas alterações a fazer aos “Grandes Códigos”?
O Deputado da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 06 de Abril de 2010.
José Pereira Coutinho