No dia 1 de Janeiro de 2009, entrou em vigor, a nova Lei das Relações Laborais. Contudo, um dos maiores defeitos do novo regime jurídico, consta no nº 5 do artigo 59, em que o salário, pode ser diminuído mediante acordo escrito entre a entidade patronal e o simples trabalhador, e produz efeitos imediatos, após mera comunicação à Direcção dos Serviços de Assuntos Laborais (DSAL) a efectuar pelo empregador no prazo de dez dias.
Como garantia dos trabalhadores contra abusos de alguns empresários pouco escrupulosos, o anterior diploma, designadamente a alínea d) do artigo 9º do D.L nº 24/89/M de 3 de Abril, proibia toda e qualquer diminuição salarial, salvo, quando precedida da competente autorização do DSAL e de acordo prévio do trabalhador. Ora esta garantia dos trabalhadores foi eliminada e a respectiva proibição de reduzir unilateralmente foi retirada, permitindo, que doravante, qualquer empresário pouco escrupuloso possa fazer o que melhor lhe apetecer, porque o DSAL, deixou de ter competência para decidir quanto à autorização legal de permitir a diminuição dos salários dos trabalhadores.
Com a eliminação desta importante garantia dos trabalhadores que perdurou quase dezanove anos, cada vez mais operadoras de Jogo começaram a introduzir planos de reduções salariais, invocando “desculpas de mau pagador” tais como a crise económica internacional.
Mas o mais grave de tudo, tem a ver com o facto dos nossos trabalhadores não disporem de qualquer tipo de negociação livre, independente e justa, no sentido de poderem reivindicar os seus legítimos interesses e direitos.
O exemplo mais flagrante foi o caso dos cerca de seis mil trabalhadores terem sido obrigados a reduzir em cerca de 13,3% dos seus salários, cujas condições foram impostas unilateralmente sem qualquer margem de negociação equilibrada e justa para os trabalhadores. Na ausência de legislação sindical e de negociação colectiva, o elo mais fraco da relação laboral, não teve outra escolha, senão aceitar e rubricar as injustas clausulas impostas pela entidade patronal.
Por isso, um Governo responsável e justo, devia ter a obrigação constitucional de regulamentar a liberdade sindical e a negociação colectiva constante no artigo 27º da Lei Básica, que envolve um conjunto de garantias que, no essencial, materializam princípios internacionalmente reconhecidos, em especial os constantes das Convenções nºs 87 e 98 da Organização Internacional do Trabalho. Compete ao Governo defender sempre o elo mais fraco da relação laboral, dando ao futuro projecto-lei, um corpo de garantias, consagrando um conjunto de princípios fundamentais que garantam o exercício do direito de associação sindical, designadamente, o princípio da independência, da autonomia e da gestão democrática das associações.
Hoje em dia, em qualquer país civilizado e mesmo nas regiões adjacentes, o direito individual do trabalho, pouco a pouco, é completado pela conjugação dos meios de defesa, através da junção de forças da classe trabalhadora, personificada no sindicato e obtido mediante a negociação colectiva dos seus legítimos interesses e direitos.
No recente caso de diminuição salarial dos trabalhadores da Venetian, a única solução para a maioria dos trabalhadores foi a de aceitar resignados a proposta apresentada pela mega empresa. Quase todos os trabalhadores prejudicados têm a noção de que não aceitando a proposta de redução salarial, conduziria, a breve e médio trecho ao eventual despedimento com ou sem justa causa.
Quase sempre, como no passado, com ou sem crise económica os trabalhadores são sempre os sacrificados e os primeiros a pagar com a “factura”.
Assim sendo, interpelo o Governo, sobre o seguinte:
Após quase nove anos de governação, e tantos milhares casos de exploração dos trabalhadores, o Governo que sempre fez uma enorme propaganda com os slogans de “servir a população” e “acudir os cidadãos em tempo útil” deveria cumprir, pelo menos, até ao final do seu mandato, com a mesma rapidez e eficiência demonstrada na apresentação do projecto quanto ao artigo 23º a “obrigação constitucional” prevista no artigo 27º da Lei Básica, aperfeiçoando o ordenamento jurídico da RAEM, dando execução às normas para-constitucionais e internacionais, tais como a Convenção nº 98 da Organização Internacional de Trabalho (OIT) sobre a Aplicação dos Princípios do Direito de Organização e de Negociação Colectiva, adoptada em Genebra, em 1 de Julho de 1949 que se encontra em vigor na RAEM, desde o ano de 2001. Vai o Governo ainda neste mandato apresentar o projecto-lei de liberdade sindical e de negociação colectiva a fim evitar que diariamente centenas e centenas de trabalhadores deixem de ser explorados nos seus legítimos interesses e direitos?
O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau aos 8 de Janeiro de 2009.
José Pereira Coutinho