ATFPM DIRECÇÃO

JOSÉ PEREIRA COUTINHO

Deputado à Assembleia Legislativa e Presidente da Direcção da ATFPM

ATFPM Traimestral

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NOTA JUSTIFICATIVA

Regime da Actualização das Rendas de Bens Imóveis

1.      Desde há muito que se faz sentir uma forte especulação no mercado imobiliário da Região Administrativa Especial de Macau, adiante RAEM, que tem a sua principal origem em investidores do exterior que procuram adquirir imóveis na RAEM não para os habitarem, mas para aguardarem pela sua valorização e assim captarem mais-valias aquando da revenda. Numa economia capitalista de mercado aberto, de cariz vincadamente liberal, como é a da RAEM, nada há a apontar que investidores capitalistas obtenham mais-valias e lucros, ainda que elevados, através do investimento no mercado imobiliário local. Mas é também certo que não é razoável continuar a permitir que o universo das habitações da RAEM, ou, por exemplo, os imóveis destinados a arrendamento comercial e os destinados a arrendamento para exercício de profissões liberais em resultado de investimentos puramente especulativos do exterior, veja os seus valores subirem para preços que não estão ao alcance da maioria da população.

2.      Como ocorre actualmente, e como se irá agravar no futuro próximo, dado que decorre dos dados da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos que apenas em 2012 o preço de compra da habitação subiu 46%, aproximadamente 3,9% ao mês, fixando-se no final de Dezembro de 2012 em 70.407 patacas por metro quadrado contra 45.540 patacas por metros quadrados em Dezembro de 2011. No mesmo período, a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos reporta que a taxa de inflação anual, sem considerar o custo de habitação, atingiu 6,11%.

De acordo com dados dos Serviços de Estatística e Censos, relativos à taça de inflação em Setembro de 2013 face aos 12 meses imediatamente anteriores, registaram-se acréscimos significativos nos índices de preços das secções habitação e combustíveis de 9%).

Com alguns atrasos, é expectável que as actualizações salariais anuais, no sector público e privado, aproximem um pouco do valor da taxa de inflação, ou fiquem mesmo muito abaixo da inflação, sem reflectirem o aumento do custo da habitação. Entenda-se que o aumento do preço de mercado da habitação se irá reflectir inevitavelmente a curto prazo em agravamentos nos valores das rendas cobradas pelo arrendamento de imóveis para habitação, o que notoriamente já veio a ocorrer nos últimos anos com aumentos sucessivos e violentos das rendas cobradas no mercado imobiliário da RAEM.

3.      A classe média da RAEM encontra-se numa posição de grande fragilidade perante estas esmagadoras forças do mercado, dado que por um lado muitas vezes não consegue através do trabalho auferir rendimentos suficientes para adquirir habitação própria, o que será de resto cada vez mais difícil por força do aumento do preço dos imóveis, e por outro lado aufere rendimentos demasiado elevados para ter direito a habitação social ou económica. A classe média fica assim «ensanduichada» entre os ricos que podem pagar os elevados preços dos imóveis praticados no mercado imobiliário da RAEM e os apoios públicos que apenas os mais pobres conseguem auferir, dado os muito baixos limites de rendimentos anuais que são requisitos para a obtenção de casas públicas (por exemplo, para a habitação social o limite do rendimento mensal para um agregado familiar de uma pessoa é de 7.820 patacas, claramente abaixo do limiar da pobreza).

Por outro lado, por exemplo, as pequenas e médias empresas não têm possibilidade de suportar os aumentos especulativos das rendas destinadas a fins comerciais, bem como ao arrendamento para exercício de profissão liberal. Muitas têm de fechar os seus negócios, o que põe em causa o desígnio político do Governo de Macau, apoiado pelo Interior da China, de diversificação da economia de Macau.

4.      Este cenário, bem conhecido da sociedade civil da RAEM e alvo de preocupações crescentes pela população, requer urgentemente uma intervenção reguladora da Assembleia Legislativa, sendo este projecto de lei uma iniciativa legislativa que visa dar resposta aos anseios da população de conseguirem ter a possibilidade de suportarem rendas minimamente razoáveis, actualizadas anualmente em função da inflação apurada pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, e que não continuarem a sofrer aumentos permanentes e excessivos em resultado de pressões especulativas e da ganância dos investidores capitalistas do exterior.

5.      Refira-se que numa auscultação pública, realizada de forma científica antes da apresentação do presente projecto lei, a grande maioria da população manifestou o apoio a iniciativa. Damos assim cumprimento à vontade da população.

6.      O projecto de lei visa proteger os inquilinos ao estabelecer limites legais à liberdade contratual das partes no que diz respeito à fixação do valor das rendas dos imóveis destinados à habitação, afastando-se que as rendas possam ser actualizadas livremente, pelo acordo das partes, sem terem como base a inflação ocorrida no ano em causa. Tal visa dar resposta ao excessivo aumento das rendas que ocorreu nos últimos anos, onde muitas vezes os senhorios impuseram actualizações de rendas demasiado elevadas aos inquilinos, colocando os inquilinos numa posição difícil de terem que aceitar esses aumentos ou terem que sair da casa arrendada, ou do negócio que desenvolvem o que reduz fortemente a sua capacidade negocial.

7.      O projecto de lei propõe que as rendas dos imóveis destinados a habitação e, por exemplo, a arrendamento comercial e a arrendamento para exercício de profissão liberal passem a ser actualizadas anualmente em função do índice de inflação apurado pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, e nunca durante os primeiros dois anos de validade do contrato de arrendamento, permitindo que o valor das rendas acompanhe a inflação ou deflação registada no período em questão, mas afastando aumentos especulativos e excessivos que desprotegem os inquilinos.

8.      Em caso de violação deste regime legal de actualização de rendas nos imóveis destinados à habitação, e, por exemplo, a arrendamento comercial e a arrendamento para exercício de profissão liberal o projecto de lei determina a existência de uma responsabilidade civil contratual por danos causados com o excesso de renda cobrado, bem como a aplicação de infracções administrativas, ou em casos mais graves mesmo uma responsabilidade penal, que visam sancionar o senhorio que incumpra com este regime legal obrigatório e imponha aumentos de rendas excessivos em desconformidade com os limites previstos no projecto lei.

9.      A fiscalização do regime da actualização das rendas de bens imóveis destinados a habitação, bem como a competência para a imposição das multas administrativas previstas no projecto lei, são incumbidas ao Instituto de Habitação.

10.  Atendendo à situação de verdadeira emergência social que se verifica neste momento no mercado imobiliário da RAEM, onde as rendas nos últimos anos subiram de forma excessiva e descontrolada, muitas vezes duplicando de um ano para o outro, o projecto lei entende que se justifica que num período transitório de dois anos as rendas dos imóveis destinados à habitação sejam congelados, não podendo sofrer quaisquer aumentos ou actualizações durante dois anos.

 

 

O Deputado à Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de

Macau aos 19 de Novembro de 2013.

 

 

José Pereira Coutinho e Leong Veng Chai

 

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REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU

 

Lei n.º    /2013

 

(Projecto de lei)

Regime da Actualização das Rendas de Bens Imóveis

 

A Assembleia Legislativa decreta, nos termos da alínea 1) do artigo 71.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, para valer como lei, o seguinte:

 

 

Artigo 1.º

Objecto e âmbito de aplicação

 

1. A presente lei aprova o regime da actualização de rendas para os bens imóveis sitos na Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM, que sejam objecto de contrato de arrendamento, independentemente da sua finalidade.

2. A presente lei não é aplicável ao arrendamento em regime de habitação social.

 

 

 

Artigo 2.º

Actualização de rendas

 

1. A primeira actualização só pode ser exigida dois anos após o início da vigência do contrato e as seguintes actualizações, sucessivamente, um ano após a actualização anterior;

2. Sem prejuízo do previsto na alínea anterior, a renda só pode ser actualizada anualmente, de acordo com os coeficientes de actualização vigentes;

3. O senhorio comunica, por escrito e com a antecedência mínima de 90 dias, ao inquilino o coeficiente de actualização e a nova renda dele resultante;

4. A não actualização da renda prejudica a recuperação dos aumentos não feitos no ano em curso, podendo, todavia, os coeficientes ser aplicados em anos posteriores, desde que não tenham passado mais de três anos sobre a data em que teria sido inicialmente possível a sua aplicação.

 

Artigo 3.º

Coeficiente de actualização

 

1. O coeficiente de actualização anual de renda dos diversos tipos de arrendamento é o resultante da totalidade da variação do índice de preços no consumidor, sem habitação, correspondente aos últimos 12 meses e para os quais existam valores disponíveis à data de 31 de Agosto, apurado pela Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, adiante designada de DSEC.

2. O coeficiente referido no número anterior é publicado por aviso da DSEC na II.ª Série do Boletim Oficial da RAEM até 30 de Outubro de cada ano.

3. Quando se inicie novo arrendamento após um período durante o qual a coisa não esteve arrendada, o coeficiente de actualização será o resultante da totalidade da variação do índice de preços no consumidor, sem habitação, verificada desde a data em que a última renda foi fixada ou desde a data em que ela poderia ter sido alterada, consoante a que for mais recente.

 

Artigo 4.º

Arredondamento

 

1. A renda resultante da actualização referida no artigo anterior é arredondada para a unidade de pataca imediatamente superior.

2. O mesmo arredondamento se aplica nos demais casos de determinação da renda com recurso a fórmulas aritméticas.

 

Artigo 5.º

Imperatividade

 

O regime de actualização das rendas estabelecido na presente lei é imperativo, sendo juridicamente inexistentes quaisquer estipulações negociais que o infrinjam, sem prejuízo da responsabilidade civil, administrativa ou penal a que haja eventualmente lugar nos termos da lei.

 

Artigo 6.º

Responsabilidade civil

 

A actualização de rendas em violação do regime previsto na presente lei gera responsabilidade contratual nos termos gerais do Código Civil.

 

Artigo 7.º

Infracções administrativas

 

1.      A actualização da renda que exceda os limites fixados na presente lei é sancionada com multa:

1) De 20 000 a 200 000 patacas, se o arrendamento tiver fim habitacional;

2) De 10 000 a 100 000 patacas, se o arrendamento tiver outro fim.

3. A multa é reduzida a um terço quando a violação dos limites legais fixados na presente lei ocorra por negligência.

4. A multa é reduzida a metade quando o infractor se apresente voluntariamente às entidades competentes para a fiscalização da presente lei.

.

Artigo 8.º

Reincidência

 

1. Considera-se reincidência a prática de uma infracção idêntica no prazo de dois anos a contar da decisão judicial ou administrativa que determinou, em definitivo, a punição ou sanção.

2. Em caso de reincidência, o limite máximo da multa aplicável é elevado de um terço.

 

Artigo 9.º

Responsabilidade pelo pagamento das multas

 

1. A responsabilidade pelo pagamento das multas recai sobre o autor das infracções administrativas previstas na presente lei.

2. Tratando-se de pessoa colectiva os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gerência em pessoas colectivas, são subsidiariamente responsáveis pelo pagamento das multas aplicadas pela prática de infracções administrativas previstas na presente lei, por factos praticados no período de exercício do seu cargo, salvo se provarem que exerceram as suas funções com zelo e diligência e não foi por culpa sua que a pessoa colectiva praticou a infracção punida.

3. Se forem várias as pessoas responsáveis nos termos do número anterior, a sua responsabilidade é solidária.

 

Artigo 10.º

Responsabilidade penal

 

Quem levar o inquilino a aceitar um aumento de renda em manifesto excesso do limite legalmente previsto na presente lei é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias.

 

Artigo 11.º

Fiscalização

 

1. Compete ao Instituto de Habitação a fiscalização do cumprimento do regime de actualização de rendas para os imóveis destinados à habitação previsto na presente lei e a aplicação das sanções administrativas decorrentes do seu incumprimento, sem prejuízo das competências legalmente atribuídas a outras entidades.

 

2. Compete à Direcção dos Serviços de Economia a fiscalização do cumprimento do regime de actualização de rendas não previstas no número anterior e a aplicação das sanções administrativas decorrentes do seu incumprimento, sem prejuízo das competências legalmente atribuídas a outras entidades.

 

Artigo 12.º

Destino das multas

 

As multas previstas na presente lei constituem receitas próprias do Instituto de Habitação ou da Direcção dos Serviços de Economia.

 

Artigo 13.º

Direito subsidiário

 

Em tudo o que não se ache especialmente regulado na presente lei, aplicam-se, subsidiariamente, consoante a natureza das matérias, o Código Civil, o Código do Procedimento Administrativo, o Código Penal e o Regime geral das infracções administrativas e respectivo procedimento.

 

Artigo 14.º

Regime transitório

 

1. No período de dois anos após a entrada em vigor da presente lei, as rendas dos imóveis não podem ser sujeitos a quaisquer aumentos ou actualizações.

2. O regime das infracções administrativas previsto no artigo 6.º e o regime de responsabilidade penal previsto no artigo 11.º aplicam-se, com as necessárias adaptações, à violação do disposto no número anterior.

 

Artigo 15.º

Entrada em vigor

 

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

 

 

Aprovada em    de            de 2013.

 

O Presidente da Assembleia Legislativa, ______________________

Ho Iat Seng

 

Assinada em    de            de 2013.

Publique-se.

 

 

O Chefe do Executivo, _____________________

Chui Sai On

 

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